Mar português em dias cor de cinza |
Somos destroços entre objectos e as coisas
Que se instalam no âmago e nos devolvem a aparência
Como imagem especular de urgências
Multicores...
Ajoelhamos perante novos deuses e sacrificamos
Mansidões no lugar geométrico da Abundância.
Novos jardins de Canaã lambendo os dedos
E olhos esventrados na luz fria dos néons.
E calcorreamos o tempo, acorrentados. Novos altares
Erguidos no fervor do Mesmo - cacofonia de uma Festa
De que perdemos razão e rasto.
Sons e cores apenas. Esbracejantes. Sobras
Do festim com que novos ritos se adornam
Na celebração do Excesso...
É neles que reina a divindade e se erguem catedrais
Em seu louvor e culto. São eles a grande Metáfora
Que abocanha. E a Cloaca...
Espectros vivos em cerimonial de nados-mortos.
Somos amontoado e panóplia.
E o Espectáculo.
E a euforia do Crepúsculo
E a pletórica profusão da Mercadoria
Como desenho quimérico do Mito
Demiúrgico...
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Importa redimir a inocência das coisas
E libertar a palavra deserta. E no rosto solar dos homens
Estilhaçar o Espelho e verter o vento.
E as mãos doridas. E o barro amassado.
E a dores do parto.
E na imanência redentora das sombras
Escutar a subtil Diferença.
E alargar espaços onde os dias sejam
Claros.
Manuel Veiga in Relógio de Pêndulo