sexta-feira, maio 12, 2006

Como um barco...



Como um barco assim cheguei
na calma ondulação das tardes
e a ti eu aportei...

E lento eu desfiz
a armação das velas e te amei
enquanto o sol brilhava...

E nas gotas que ficaram
nas curvas do teu corpo
dos suores de nós...

Reentrei firme e fundo
e nessas águas inventamos
o caminho para casa...


(Poema de Eduardo Leal)





Imagem de autor desconhecido

quarta-feira, maio 10, 2006

Mulher Maio...


Imagem de Margaret Ballif Simon


Bom dia minha amiga digo em Maio
És uma rosa à beira de um tractor
Neste campo de Abril onde não caio
A nossa sementeira já deu flor

Bom dia minha amiga, eu sou um gaio,
Um pássaro, liberto pela dor
Tu és a companheira, donde saio
Mais limpo de mim próprio mais amor

Bom dia meu amor estamos primeiro
Neste tempo de Maio a tempo inteiro
Contra o tempo do ódio e do terror

Se tu és camponesa eu sou mineiro
Se carregas no ventre um pioneiro
Dentro de ti eu fui trabalhador


(Poema de José Carlos Ary dos Santos)

segunda-feira, maio 08, 2006

Um Poema em Maio...


Óleo de Diane Romanello


a noite quente de Maio
tem gente,
que nasceu das papoilas,
dos malmequeres, dos poentes.

Toda a gente tem camisa aberta, t shirt,
sorriso, ritmo, luz, uma brisa que sopra lentamente.

as palavras circulam, derretidas, na roupa, na mão contra a mão,
no afago do passo no passeio.

a lua espraia indolente a luz macia na festa na varanda dos vizinhos
defronte, até às tantas.

Há choupos, urzes, fetos e carvalhos no jardim lúdico da minha mente.
ribeiros, charcos, grilos e lençois brancos da minha memória na piscina.

Tudo diferente do jornal malicioso das notícias, dos concursos electrónicos de televisão, das bielas giratórias dos automóveis, dos irritantes casamentos milionários monárquicos, da estupidez, do hediondo, do rídiculo.

uma ideia na ponta do cigarro, uma letra no dedo mindinho, um trevo no desejo,
...um sono profundo...


um poema em Maio


(Poema de Constantino Alves*)



*(Autorizado pelo Autor e lido na Noite de Poesia de Vermoim, dedicada ao tema Cantigas de Maio)

sábado, maio 06, 2006

Maio...

Imagem de Barbara Mathews


falo-te em Maio do pão
dias de Abril que lá vão
em Maio por ter de ser algo maior que o viver
grita em Maio a Primavera
lamenta-se quem fica à espera
perdido na contradança de perder de si a esperança

e há sempre punhos cerrados contra muros de opressão
feridas as mãos de Maio
como se flores em desmaio
feridas as flores no chão
por temores alucinados e combates de uma vida
a combater pelo pão

mas chega já Maio ao mar de giestas descobertas
numa ânsia de crescer
que não se vende o amor
e mesmo as nuvens incertas tapam o Sol por temor
de que lhes morra o voar por não saberem crescer

e eu aqui a falar de pão neste Maio de espantar
dias de Abril que lá vão
e há tanto aí por crescer
e há tanto amor por amar
que o mar nem chega a secar por mais que o seque o Verão.

(Poema de Jorge Castro)


( lido na Noite de Poesia de Vermoim, dedicada ao tema Cantigas de Maio)

quinta-feira, maio 04, 2006

O corpo...


É pêssego
Tangerina
E é limão

Tem sabor a damasco
e a alperce

Toma o gosto da canela
de manhã
e à noite a framboesa que se despe

De maça guarda o pecado
e a sedução

Do mel
o açúcar que reveste

Do licor
a febre que no seu rasgão
me invade me inunda e me apetece

Mergulho depressa a minha boca
e bebo a sede
que em mim já cresce

Delírio que me enche
de prazer
tomando o ponto num lume que humedece

Devagar mexo sem tino
as minhas mãos

Provando de ti
o que de ti viesse

O anis do esperma
o doce odor do pão
que o teu corpo espalha e enlouquece

(Poema de Maria Teresa Horta in Só de amor,1999)


Imagem enviada por email, de autor desconhecido

terça-feira, maio 02, 2006

Maio... ou a Canção da Primavera...

Eu, dar flor, já não dou. Mas vós, ó flores,
pois que maio chegou,
Revesti-o de clâmides de cores!
Que eu, dar flor, já não dou.

Eu, cantar já não canto. Mas vós, aves,
Acordai desse azul,calado há tanto,
As infinitas naves!
Que eu, cantar, já não canto.

Eu, invernos e outonos recalcados
Regelaram meu ser neste arripio...
Aquece tu, ó sol, jardins e prados!
Que eu, é de mim o frio.

Eu, Maio, já não tenho. Mas tu, Maio,
Vem, com tua paixão,
Prostrar a terra em cálido desmaio!
Que eu, ter Maio, já não.

Que eu, dar flor, já não dou; cantar,não canto;
Ter sol, não tenho; e amar...
Mas, se não amo,
Como é que, Maio em flor, te chamo tanto,
E não por mim assim te chamo?

(Poema de José Régio)

(Imagem de Luana Silence)

domingo, abril 30, 2006

Neste ultimo dia de Abril... Poema...


A minha vida é o mar o Abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita

Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará

Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento

A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto

Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento

E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada

(Sophia de Mello Breyner Andresen in Poema)

quarta-feira, abril 26, 2006

Canto para os teus nomes


Muitos nomes te dei:
amiga
mar
chuva caindo
odores de terra e espuma...
dei-te nome
de paz que achamos em nós
nome com gosto a amoras
na tua boca
Primavera
casa
exílio
porto sem amarras
aonde me fundeio
Chamei-te chuva
chamei-te lume
chamo-te calor
Teus nomes
permanecem
no teu rosto
em qualquer distância
Teus nomes
onde vivo projectado
(barro moldado como imagem)...
Na bruma da memória
te construo
oleiro que sou nas horas vagas
meus dedos
desenham-te as feições
dizem o teu nome
um nome só para ti
secreto e único
nome de qualquer ausência
mais presente.
Um nome das horas sós
quando tu estás.

(Poema Jorge Esteves)


Imagem enviada por email, de autor desconhecido

terça-feira, abril 25, 2006

Homenagem...






Aquele que na hora da vitória
Respeitou o vencido

Aquele que deu tudo e não pediu a paga

Aquele que na hora da ganância
Perdeu o apetite

Aquele que amou os outros e por isso
Não colaborou com a sua ignorância ou vício

Aquele que foi «Fiel à palavra dada à ideia tida»
Como antes dele mas também por ele
Pessoa disse


(Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen
Dedicado a
Salgueiro Maia)

segunda-feira, abril 24, 2006

Oh! Liberdade!

Falar de Liberdade, é também falar de Timor…
Dedicado à Milu e ao
José Gomes, pela sua força e espírito combativos…



Se eu pudesse
pelas frias manhãs
acordar tiritando
fustigado pela ventania
que me abre a cortina do céu
e ver; do cimo dos meus montes,
o quadro roxo
de um perturbado nascer do sol
a leste de Timor.

Se eu pudesse
pelos tórridos sóis
cavalgar embevecido de encontro a mim mesmo
nas serenas planícies de capim
e sentir o cheiro de animais
bebendo das nascentes
que murmurariam no ar
lendas de Timor.

Se eu pudesse
pelas tardes de calma
sentir o cansaço
da natureza sensual
espreguiçando-se no seu suor
e ouvir contar as canseiras
sob os risos
das crianças nuas e descalças
de todo o Timor.

Se eu pudesse
ao entardecer das ondas
caminhar pela areia
entregue a mim mesmo
no enlevo molhado da brisa
e tocar a imensidão do mar
num sopro da alma
que permita meditar o futuro
da ilha de Timor.

Se eu pudesse
ao cantar dos grilos
falar para a lua
pelas janelas da noite
e contar-lhe romances do povo
a união inviolável dos corpos
para criar filhos
e ensinar-lhes a crescer e a amar
a Pátria Timor!

(Poema de Xanana Gusmão-1998)

Imagem de autor desconhecido

sexta-feira, abril 21, 2006

Ode à Paz...



Pela verdade, pelo riso, pela luz, pela beleza,
Pelas aves que voam no olhar de uma criança,
Pela limpeza do vento, pelos actos de pureza,
Pela alegria, pelo vinho, pela música, pela dança,
pela branda melodia do rumor dos regatos,
Pelo fulgor do estio, pelo azul do claro dia,
Pelas flores que esmaltam os campos, pelo sossego,
dos pastos,
Pela exactidão das rosas, pela Sabedoria,
Pelas pérolas que gotejam dos olhos dos amantes,
Pelos prodígios que são verdadeiros nos sonhos,
Pelo amor, pela liberdade, pelas coisas radiantes,
Pelos aromas maduros de suaves Outonos,
Pela futura manhã dos grandes transparentes,
Pelas entranhas maternas e fecundas da terra,
Pelas lágrimas das mães a quem nuvens sangrentas
Arrebatam os filhos para a torpeza da guerra,
Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna,
Ó Santa, ó talismã contra a indústria feroz,
Com tuas mãos que abatem as bandeiras da ira,
Com o teu esconjuro da bomba e do algoz,
Abre as portas da História,
deixa passar a Vida!

(Poema de Natália Correia)


Imagem de autor desconhecido

quarta-feira, abril 19, 2006

As Portas que Abril Abriu...


Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.
Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.

Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raiz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado.


Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.

Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra.

Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos.

Ora passou-se porém
que dentro de um povo escravo
alguém que lhe queria bem
um dia plantou um cravo.

Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade.

(Excerto)

(Poema de José Carlos Ary dos Santos)
(Leia
aqui o Poema completo)

Imagem de autor desconhecido

segunda-feira, abril 17, 2006

A poesia de Abril...

…fala-me de Liberdade… de Ser… de Sonhar… de Existir…
Porque de Abril todos nós colhemos um pouco…e, nesse pouco, temos que olhar o Futuro…
É Abril que vos deixo…



Isto vai meus amigos isto vai
um passo atrás são sempre dois em frente
e um povo verdadeiro não se trai
não quer gente mais gente que outra gente
Isto vai meus amigos isto vai
o que é preciso é ter sempre presente
que o presente é um tempo que se vai
e o futuro é o tempo resistente

Depois da tempestade há a bonança
que é verde como a cor que tem a esperança
quando a água de Abril sobre nós cai.

O que é preciso é termos confiança
se fizermos de maio a nossa lança
isto vai meus amigos isto vai.

(José Carlos Ary dos Santos in "O Futuro")


Imagem enviada por email, de autor desconhecido

sexta-feira, abril 14, 2006

A todos...


Aguarela de Marcos Milewski


Chegaste
Com o teu passo lento
Como se de água se tratasse
Aos meus lábios peregrinos
Ávidos de amor e de paz

Mostraste
Que a noite também tem brilho
E pelas espadas de fogo
Da voz se abrem caminhos

Indicaste
O amargo doce dos sonhos
Da transmutação dos ciclos
Que a Terra consigo traz

E quando
No seio das águas deslizo
No círculo da chama me fixo
Do deserto provo o sal
Entendo o canto
Suspenso
No pêndulo do tempo
No suave olhar da brisa
E esse sentir em menina
Que perdura sereno
Nos laços de um sorriso

"Esse sentir... em menina"

(Poema da
Amita)






quarta-feira, abril 12, 2006

Palavras...


Imagem de autor desconhecido


O mundo é de palavras.
Tudo muda,
As palavras ficam.
Escritas, gravadas, impressas,
Decoradas, transmitidas, floridas,
Doces, agressivas, rudes, compreensivas,
Meigas, brutas, cínicas, honesta,
Maldosas, inocentes,
Concretas, incoerentes,
Gritadas, cantadas, surdinas,
De amor ou de ódio,
Sinceras, fingidas,
No campo e no pódio
Na rua, na cama,
De longe, ao ouvido,
Agudas ou cavas,
O Mundo é Palavras.

Não tenho mais palavras.

(Poema de João Norte)

segunda-feira, abril 10, 2006

Esta magia é redonda...


Óleo sobre tela de Nela Vicente


Esta magia é redonda
como aquela aguarela ali adiante que salpica de verniz açucarado
o albergue de mil folhas de cetim.
É azulada como a saia do pastor. Não tem segredo nenhum.

Esta magia vem do fundo do mar
E traz com ela a sapiência do valor.

Revela a ilustração absurda,
A limpidez da travessia,
O escuro do luar.

Esta magia vem do fundo do mar.

Cheira a jasmim, rosas e bergamota.
Faz-me corar.
Empalideço quando a escuto,

Reconheço que tem razão: é fruto da minha imaginação!

(Poema da Azul)

sexta-feira, abril 07, 2006

Verbo amar...


Pintura de Freydoon Rassouli


Há um verbo que eu quero em abundância
Dizer hoje e sempre, na vida inteira,
(Fazê-lo suavemente, qual fragrância)
Na singular pessoa que é a primeira!

Um verbo que quero ouvir com muita ânsia,
Como se a hora fosse a derradeira,
Que o digas apartada de arrogância
E ao dizê-lo a alma seja verdadeira.

Há um verbo que quero no presente,
Como se ouvido no tempo passado
Não tivera o mesmo som a acolhê-lo:

Porque o amor no passado está ausente.
Pois que me vale a mim ter sido amado
Se hoje não sinto, nada, estar a sê-lo?

(Poema do JL aqui)

quarta-feira, abril 05, 2006

... poema de amor...


"Misterios de una luna" by Claudia Olivos


Anda…
Segue-me
Persegue-me
Envolve-me
Com um lenço de seda
Projectado pela retina inflamada do desejo
Anda…
Olha para o que não tocas
Anda…
Passo a passo a meu lado
Contorce-te ao som dos meus gemidos
Numa noite gélida, sobre o céu azul-escuro
Anda…
Ama-me
Anda…
Olha-me nos olhos
Anda…
Beija-me os lábios pintados de rubro inflamado
Anda…
Amassa-me em cornucópias de abraços apertados
Anda…
Cola-me ao teu corpo suado
Anda…
Tira-me o folgo
Anda…
Num labirinto feito de seda,
Deslizar, trocar o olhar, que nos ilude.
Num labirinto feito de seda,
Dispo-me
Esfrego-me
Confundindo-te com a seda.
Alimento a alma sequiosa do limiar que nos separa
A retina perdida,
Numa conjunção de traços dispersos sobre a pele desfeita
Num labirinto feito de seda,
Danço para ti
Num labirinto feito de seda,
Vergo-me a ti
Num labirinto feito de seda,
A eternidade do meu amor
Rodopia em círculos invisíveis
Até te alcançar.
Anda…
Dá-me a mão
Fecha os olhos
Anda…
O labirinto feito de seda chama por nós
Anda…
Dá-me os lábios para saborear
As mãos para que elas toquem no fundo da minha alma
No fundo do poço…
Aquele poço em que te queres perder
Ele não tem fim
É um cair eterno dentro de mim
Anda…
O labirinto não tem fim, nem principio
Ele é feito dos nossos corpos nus…
O labirinto chama por nós

Anda…

(Poema da Nadir in Unus Mundus)

segunda-feira, abril 03, 2006

Oferenda...


"The Offering" by Joop Frohwein


Dei-te meu corpo de lua
E desejos de viagem
Fiz a noite sempre tua
Dei-te meu corpo de lua
Dei-te o barco e a coragem...

Dei-te o mar da existência
E uma vida de aventura
Do sol a incandescência
E a mim, presente-ausência
Da saudade que tortura...

Dei-te meu corpo de bruma
Nos brocados do anil
Aragem, coisa nenhuma
Dei-te meu corpo de bruma
Nas alvoradas de Abril!...

(Poema Abril de Maria Mamede aqui)

sexta-feira, março 31, 2006

Fim de semana, com amor e alegria...

Imagem da Isabel Filipe


Traz-me lírios e malmequeres
Meu amor, quando voltares,
Traz-me ramos de rosas
e túlipas aos pares.

Traz flores que encham,
todas as jarras vazias
do nosso lar.

Traz contigo
beijos e carinho
Em forma de presente.

Em troca,
pinto um quadro
em forma de jardim,
Os dois passeando de mãos dadas
E tu sorrindo para mim.



( Poema da Clitie aqui)

quarta-feira, março 29, 2006

escuto o cantar do vento...


louco o vento
no sopro vibrante da melodia

cantou agitado
bailou nas folhas outonais

sóbrio
impertinente
flutuou nos sonhos

despertou preguiçoso
no jejum do dia
saudando a branca manhã

sem peso renova-se
sem medos, sem sustos
sopra no coração

poderoso e livre
torna a doce brisa amarga

engana de frente ou pelas costas
em gritos esfumados
arrasa cruel sem se deter

quebra pela força
a beleza da vida presente

(Poema e Imagem da Lena in Cabana de Palavras)

sábado, março 25, 2006

Porque…precisamos de Amigos para Viver…

Quem não sai da sua casa
Não atravessa povos, montes, vales,
Não vê as cenas bíblicas das eiras,
Nem mulheres de infusa, equilibradas,
Nem carros lentos, chiadores,
Nem homens suados,
Quem vive como o insecto cativo no seu redondel,
Cria mil olhos para nada...
Irene Lisboa

... eu saí da minha... e fui aqui ter... e trouxe comigo estas palavras...

Imagem daqui


Amigo!
apetece gritar ao mundo
ir por aí dizer a toda a gente
Dizer que não é tarde
que vale a pena esperar
amar e crer
sorrir e no sorriso dar-se
A hora sempre chega!
E, então..
o ribombar da tempestade
é doce sol nascendo
luz filtrando-se nos bagos da chuva
o sol, o firmamento
as terras, os mares
o trinado dos pássaros
o coaxar das rãs
o rugido das feras
o rumorejar do vento nos sobreiros
a calma do sorriso
o soluço no choro
é vida...vida!
A alma volteia em passos de dança
loucos, muito loucos.
Vestiste-a de brancos folhos, Amigo!
e ela rodopia
dança, dança, dança...
escorrega aqui, mas logo retoma
na mais louca das danças
ao ritmo voluptuoso da Alegria pura!
Ouve, Amigo,
Ouve!
És tu quem colocou na pauta
o dó , o ré, o mi...
as notas todas!
És tu, Amigo quem conduz a minha alma
quem doira de luz o salão
onde ela rodopia!

Debruçado nos prados, nos vales, nas montanhas
nos ribeiros, nas fontes
na vastidão do mar
na imensidão do espaço...
és tu... Amigo...

Poema da Seila

terça-feira, março 21, 2006

A todos os Poetas... este Dia...


Pintura de Almada Negreiro



Original é o poeta
que se origina a si mesmo
que numa sílaba é seta
noutro pasmo ou cataclismo
o que se atira ao poema
como se fosse um abismo
e faz um filho ás palavras
na cama do romantismo.
Original é o poeta
capaz de escrever um sismo.

Original é o poeta
de origem clara e comum
que sendo de toda a parte
não é de lugar algum.
O que gera a própria arte
na força de ser só um
por todos a quem a sorte faz
devorar um jejum.
Original é o poeta
que de todos for só um.

Original é o poeta
expulso do paraíso
por saber compreender
o que é o choro e o riso;
aquele que desce á rua
bebe copos quebra nozes
e ferra em quem tem juízo
versos brancos e ferozes.
Original é o poeta
que é gato de sete vozes.

Original é o poeta
que chegar ao despudor
de escrever todos os dias
como se fizesse amor.
Esse que despe a poesia
como se fosse uma mulher
e nela emprenha a alegria
de ser um homem qualquer.



(Ary dos Santos in Original é o Poeta)

segunda-feira, março 20, 2006

A Morte do Poeta...

Imagem de autor desconhecido



Espalham-se os guardas, as milícias
e vibram as sirenes estridentes.
Pelas ruas farejam cães-polícias:
procuram o Poeta entre as gentes.
Todos sabem que ele é um subversivo
temido, perigoso cadastrado
que afirma o direito de estar vivo
e de andar vertical por todo o lado.

Procuram nas notícias dos jornais
a cara do Poeta fugitivo
tentando descobrir alguns sinais
que o tornem, desde logo, conhecido.

Na rádio, na TV, noticiários
já lançaram apelos lancinantes
pedindo que se evitem riscos vários
de infecção com versos delirantes.

A cidade agitada, no pavor
de se envolver em tal epidemia,
não deixava que alguém fizesse amor
porque o Amor, às vezes, contagia...

Deixaram as pessoas de sorrir,
aos jovens proibiu-se namorar,
os músicos deixaram de se ouvir,
os pássaros pararam de cantar.

Impediu-se o luar de aparecer
p'ra não alimentar o romantismo.
Proibiu-se ao Homem e à Mulher
a mínima atitude de erotismo.

Decretou-se que o Dia era cinzento,
foi imposto o silêncio por decreto,
ergueu-se à Tristeza um monumento,
aboliu-se a Ternura e o Afecto.

O Poeta, acusado de loucura,
na solidão mais densa se escondia
refém de si mesmo e da amargura
que a Verdade nos outros produzia.
Apareceu então à luz do dia
com o rosto tingido de ternura.
Dois tiros acertaram no seu peito
matando a loucura em pleno dia.
Mais tarde descobriu-se o que foi feito:

Morreram o Poeta... e a Poesia!



sábado, março 18, 2006

Voltei...


...ao tema Poesia da Blogosfera.
Um longo caminho tem percorrido o autor do poema que hoje vos apresento.
É pela sua luta, pela força do seu interior, pela sua sensibilidade, que o escolhi para retomar este tema…





Venho dos limites do tempo
De uma galáxia qualquer
Já fui mar, já fui vento
Agora sou pensamento
Aparado em dado momento
No ventre de uma Mulher!

Meu corpo é magistral!
Brutal! Perfeito! Soberbo!
De início não era verbo
Agora sou o verbo ser

Tenho comigo segredos
Segredos do universo
Transporto no corpo recados
Que escrevo em forma de verso.

Venho dos limites do tempo
Não sei o que fui e sou:
Deserto? Nascente?
Já fui Norte, já fui Sul
Pó astral, mar azul!
Luar, estrela cadente.

Eu me vou!
Partirei num cometa qualquer
E serei novamente pôr-do-sol.
Cor-de-rosa, aloendro, malmequer!

Voltei...Já cá estou!
Agora sou pensamento
Nascido em dado momento
Do ventre de uma Mulher!



(Rogério Simões in "Voltei" )
Imagem de autor desconhecido

segunda-feira, março 13, 2006

Um Poema para hoje...


Este foi o último livro de Poesias que adquiri.





Ao fim de tantos anos em silêncio
descobrimos
que uma lágrima ainda sulca o rosto árido.
Com ela cultivamos esquálidos jardins
na varanda solitária
que cuidamos como parte de nós próprios.

Mais tarde, diremos "Bom-Dia"
aos pardais tranquilos no meio das flores
e, do outro lado da rua,
talvez alguém, distraído, nos sorria.



( Manuel Filipe in "Por distracção" )


É também um caminho que percorro na blogosfera… Vinde conhecê-lo aqui

sexta-feira, março 10, 2006

Caixinha de música...

Imagem de autor desconhecido


impregno-me em ti como um perfume
como quem veste a pele de odores ou a alma de
cetins
quero que me enlaces ou me enfaixes de muitos
laços
abraços fitas ou fios transparentes

em celofane brilhando uma prenda
uma menina te traz vestida de lumes
incandescendo incandescente
te quer embrulhada em véus de seda e brocado

encantada a serpente a flauta o mago
senhor toca
e quando me toca
o corpo eu abro

caixinha de música
dentro
com bailarina que dança




(Poema de Ana Mafalda Leite)

quarta-feira, março 08, 2006

Neste Dia da Mulher...


...dedicado a todas as Mulheres, mas em especial, às Viúvas do Mar…

Imagem de autor desconhecido


No passeio junto à praia,
do outro lado da estrada
duas mulheres de negro
caminham apressadas,
o vento fá-las dobrar
as saias parecem asas
debatendo-se no ar.

Do outro lado da estrada
no passeio junto ao mar
duas mulheres gemendo
parecem quase voar,
na cabeça lenços pretos
encobrem-lhes o olhar,
as mãos apertam o peito
pra o coração não estalar.

O vento uiva mais alto
trazendo gritos da praia
um espanto para lá do mar,
elas correm, como correm
nem a água as faz parar
procuram cegas os barcos
e nada há que encontrar.

Só então abrem os braços
erguendo o punho ao ar
gritam de revolta e dor,
soltam seu ódio, seu mal,
chamam, choram de amor,
e as lágrimas abrem sulcos
naqueles rostos desfeitos.

Desceu um silêncio à praia
era a morte a passear
por entre gaivotas feridas
todas de negro vestidas
olhos presos no mar.



(Poema "Destino" de Eugénia Tabosa)

domingo, março 05, 2006

Vem por entre desejos floridos...

Imagem de Naoko (Woman with Calla Lilies)



Vem por entre os floridos desejos
que esta meiga Primavera nos anuncia!

Mas traz em tua mão um ramo de giesta em flor!

E diz-me dos barcos perdidos
que levados pelas auras do Sol-Poente
lançaram âncora no doirado mar!

Diz-me da seiva túrgida e generosa
que fecunda e silenciosa corre
pelos braços e pelos sulcos de todas as coisas!

Diz-me do apelante pólen que tudo penetra
e se agita fecundante nas rubras corolas!

Diz-me das amorosas melodias
que os pássaros soltam gementes
quando o sol se abriga em seu palácio de coral!

E diz-me das cinzentas nuvens
onde os pássaros de fogo fazem ninho
e onde se gera a perenidade dos deuses!

De tudo me dirás, quando se abrir
a silenciosa porta que conduz à recolha
dos apelos que gritam pela eternidade!



(José Nuno Pereira Pinto in "O Tempo dos Desejos Floridos")

sexta-feira, março 03, 2006

Asa no espaço...




Asa no espaço, vai, pensamento!
Na noite azul, minha alma flutua!
Quero voar nos braços do vento,
Quero vogar nos braços da Lua!

Vai, minha alma, branco veleiro,
vai sem destino, a bússola tonta...
Por oceanos de nevoeiro
corre o impossível, de ponta a ponta.

Quebra a gaiola, pássaro louco!
Não mais fronteiras, foge de mim,
que a terra é curta, que o mar é pouco,
que tudo é perto, princípio e fim.

Castelos fluídos, jardins de espuma,
ilhas de gelo, névoas, cristais,
palácios de ondas, terras de bruma,
... Asa, mais alto, mais alto, mais!



(Poema de Fernanda de Castro)


Desconheço a autoria da imagem

segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Boneco Desfeito...

Imagem daqui


Surgiu no palco, um dia um bailarino,
Surgiu soberbamente nu, - jogando
Nas mãos ageis de clown e de menino
Cem máscaras rodando, rodopiando...

Sobre um décor violento e sibilino
Cegamente bailou, tombou bailando,
Como se mais não fora seu destino
Que os eu bailado altivo e miserando.

No palco jaz agora um mutilado:
Jaz morto e nu, decapitado, olhado
Por milhões de olhos sem pudor nem vista.

...Que as máscaras sem fim que ele jogara
Não eram mais, talvez, que a própria cara
Dum desgraçado e humano ilusionista!


(Poema de José Régio)

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Hora



Sinto que hoje novamente embarco
Para as grandes aventuras,
Passam no ar palavras obscuras
E o meu desejo canta --- por isso marco
Nos meus sentidos a imagem desta hora.

Sonoro e profundo
Aquele mundo
Que eu sonhara e perdera
Espera
O peso dos meus gestos.

E dormem mil gestos nos meus dedos.

Desligadas dos círculos funestos
Das mentiras alheias,
Finalmente solitárias,
As minhas mãos estão cheias
De expectativa e de segredos
Como os negros arvoredos
Que baloiçam na noite murmurando.

Ao longe por mim oiço chamando
A voz das coisas que eu sei amar.

E de novo caminho para o mar.



(Poema de Sophia de M B Andresen)


Imagem de autor desconhecido

domingo, fevereiro 19, 2006

Branco e vermelho...

É um pouco longo, mas vale a pena...


Pintura de Alice Candeias

A dor, forte e imprevista,
Ferindo-me, imprevista,
De branca e de imprevista
Foi um deslumbramento,
Que me endoidou a vista,
Fez-me perder a vista,
Fez-me fugir a vista,
Num doce esvaimento.
Como um deserto imenso,
Branco deserto imenso,
Resplandecente e imenso,
Fez-se em redor de mim.
Todo o meu ser, suspenso,
Não sinto já, não penso,
Pairo na luz, suspenso...
Que delícia sem fim!
Na inundação da luz
Banhando os céus a flux,
No êxtase da luz,
Vejo passar, desfila
(Seus pobres corpos nus
Que a distância reduz,
Amesquinha e reduz
No fundo da pupila).
Na areia imensa e plana
Ao longe a caravana
Sem fim, a caravana
Na linha do horizonte
Da enorme dor humana,
Da insigne dor humana...
A inútil dor humana!
Marcha curvada a fonte.
Até o chão, curvados,
Exaustos e curvados,
Vão um a um, curvados,
Os seus magros perfis;
Escravos condenados,
No poente recortados,
Em negro recortados,
Magros, mesquinhos, vis.
A cada golpe tremem
Os que de medo tremem,
E as pálpebras me tremem
Quando o açoite vibra.
Estala! e apenas gemem,
Palidamente gemem,
A cada golpe gemem,
Que os desequilibra.
Sob o açoite caem,
A cada golpe caem,
Erguem-se logo.
Caem, Soergue-os o terror...
Até que enfim desmaiem!
Por uma vez desmaiem!
Ei-los que enfim se esvaem,
Vencida, enfim, a dor...
E ali fiquem serenos,
De costas e serenos.
Beije-os a luz, serenos,
Nas amplas fontes calmas.
Ó céus claros e amenos,
Doces jardins amenos,
Onde se sofre menos,
Onde dormem as almas!
A dor, deserto imenso,
Branco deserto imenso,
Resplandecente e imenso,
Foi um deslumbramento.
Todo o meu ser suspenso,
Não sinto já, não penso,
Pairo na luz, suspenso
Num doce esvaimento.
Ó morte, vem depressa,
Acorda, vem depressa,
Acode-me depressa,
Vem-me enxugar o suor,
Que o estertor começa.
É cumprir a promessa.
Já o sonho começa...
Tudo vermelho em flor...

(Poema de Camilo Pessanha)

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Primaveras Românticas...




Eu sou a concha das praias
Que anda batida da onda
E, de vaga em outra vaga,
Não tem aonde se esconda.
Mas se um menino, da areia
A colher e a for guardar
No seio... ali adormece
E é ali seu descansar.
Pois sou a concha da praia
Que anda batida da onda...
Sê tu esse seio infante,
Aonde a triste se esconda!

Eu sou quem vaga perdido,
Sob o sol, com passo incerto,
Contando por suas dores
As areias do deserto.
Mas se um palmar, no horizonte,
Se vê, súbito, surgir,
Tem ali a tenda e a fonte
E é ali o seu dormir.
Pois sou quem vaga perdido,
Sob o sol, com passo incerto...
Sê tu sombra de palmeira,
Sê-me tenda no deserto!

Sou o peito sequioso
E o viúvo coração,
Que em vão chama, em vão procura
Outro peito, seu irmão.
Mas se avista, um dia, a alma
Por quem andou a chamar,
Tem ali ninho e ventura
E é ali o seu amar.
Pois sou quem anda chorando
À procura dum irmão...
Sê tu a alma que me fale,
Inda uma hora ao coração!


(Poema de Antero de Quental )


Imagem enviada por email, de autor desconhecido

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Loas à chuva e ao vento...

As pequenas gotas batiam na janela, embalando o meu sono. Aconcheguei melhor o rosto na almofada e recordei um Poema que em tempos li. 
Deixo-o aqui…


Chuva, porque cais?
Vento, aonde vais?
Pingue... Pingue... Pingue...
Vu... Vu...Vu...
Chuva, porque cais?
Vento, aonde vais?
Pingue... Pingue... Pingue...
Vu... Vu...Vu...
Ó vento que vais,
Vai devagarinho.
Ó chuva que cais,
Mas cai de mansinho.
Pingue... Pingue...
Vu... Vu…
Muito de mansinho
Em meu coração
Já não tenho lenha
Nem tenho carvão...
Pingue... Pingue...
Vu... Vu…
Que canto tão frio,
Que canto tão terno,
O canto da água,
O canto do Inverno...
Pingue...
Que triste lamento,
Embora tão terno,
O canto do vento
O canto do Inverno...
Vu...
E os pássaros cantam
E as nuvens levantam.


(Poema de Matilde Rosa Araújo in "O Livro da Tila")


Desconheço a autoria da imagem, a quem souber, agradeço indicação de autor...

segunda-feira, janeiro 30, 2006

Não empregar o nome em vão…

"Ao dar início a este Blog foi minha intenção valorizar os autores Portugueses por vezes tão mal amados por aqueles que falam a sua língua."



Este foi o intróito que escrevi, quando resolvi incluir nas páginas deste blog, poemas e textos de outros blogues, que pela sua força e sensibilidade, achei que os deveria aqui partilhar, sabendo de antemão que não eram escritos por nomes sonantes da nossa Poesia.

Este Blog era um projecto que acarinhava na minha mente, em dar a conhecer Poesia e Poetas de Língua Portuguesa, independentemente de serem conhecidos ou não.


Foi isso que fiz.


Parti à aventura, “navegando” por entre palavras profundas de almas sensíveis, que sem qualquer interesse, ofereciam a quem as lia, toda a profundidade de sabedoria de sentires e afectos, que conquistaram o meu coração.


Por isso, quando li o comentário de um anónimo, que se assina por SA dizendo: - Aproveita para leres Poesia Portuguesa. Não empregues o seu nome em vão.veio-me à memória os Poetas mal-amados, desprezados, humilhados, pela sociedade que os não compreendia (estou a lembrar-me de António Aleixo), mas que anos depois, os elogiam, lhes levanta monumentos e, os trata quase como heróis…


“Não empregues o seu nome em vão” 


Como se pode empregar o nome da Poesia Portuguesa em vão, num local onde a prioridade é dá-la a conhecer?

Não poderia deixar passar este comentário em branco, não por considerar que afecta as minhas escolhas, mas sim os autores que escolhi pela beleza, sensibilidade e força das suas palavras.


É por eles, que aqui estou.


Deixo-vos um poema de alguém, que ainda hoje é tão mal amado por aqueles que falam a sua língua…


Chorosos versos meus desentoados,
Sem arte, sem beleza e sem brandura,
Urdidos pela mão da Desventura,
Pela baça Tristeza envenenados:

Vede a luz, não busqueis desesperados,
No mudo esquecimento a sepultura;
Se os ditosos vos lerem sem ternura,
Ler-vos-ão com ternura os desgraçados:

Não vos inspire, ó versos, cobardia
Da sátira mordaz o furor louco,
Da maldizente voz a tirania:

Desculpa tendes, se valeis tão pouco;
Que não pode cantar com melodia
Um peito, de gemer cansado e rouco.



( Poema de Manuel Maria Barbosa du Bocage)


Imagem de autor desconhecido

sexta-feira, janeiro 27, 2006

O Silêncio




Quando a ternura
parece já do ofício fatigada,

E o sono, a mais incerta barca,
inda demora,

Quando azuis irrompem
os teus olhos

e procuram
nos meus navegação segura,

é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,

pelo silêncio fascinadas



(Poema de Eugénio de Andrade)


 Escultura de Laurent Cachard

domingo, janeiro 22, 2006

Um breve olhar...

Imagem daqui


Lá em cima, no ar
Sobre a monotonia de estas casas
Sulcando, sereníssimas, os céus,
Abrem a larga rima das suas asas,
Lenços brancos do azul, dizendo adeus
Ao vento e ao mar.

Eu fico a vê-las
E meus olhos, de as verem, vão partindo
E fugindo com elas;
E a segui-las eu penso,
Enquanto o olhar no azul se espraia e prega,
Que há uma graça, que há um sonho imenso
Em tudo o que flutua e que navega…

Para onde se desterram as gaivotas,
Contra o vento vogando, altas e belas,
Essas voantes e pairantes frotas,
Essas vivas e alvas caravelas?

Vão para longe… E lá desaparecem,
Ao largo, por detrás do monte;
E os nossos olhos olham e entristecem
Com as vagas saudades que merecem
As coisas que se somem no horizonte!

(In "Canção do Vento" de Afonso Lopes Vieira)

…porque há momentos em que nos faltam as palavras, esta é a forma de expressar o meu reconhecimento e afecto a todos aqueles que mantiveram a chama acesa neste blogue, enquanto recuperava da lesão que me afectou…

OBRIGADA

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Morrendo de saudades...



Por motivos imprevistos e ligados à minha saúde, estarei por breves dias (espero…) ausente, pelo que estarei impedida de actualizar os meus blogues e de vos ler também.


Um abraço carinhoso e saudoso a todos,
espero voltar muito em breve...

sexta-feira, janeiro 06, 2006

O Pássaro da Alma

As palavras saídas dos lábios das crianças têm um misto de ingenuidade, sentimento e poesia… porque a poesia está em cada palavra saída do fundo do coração, do fundo da nossa alma…especialmente as que saem do coração de uma criança. Quero assim com a ingenuidade das palavras de uma criança comemorar, desejando-vos um


FELIZ DIA DE REIS

Visage De La Paix(Serigraph)by Pablo Picasso


"João, paras quieto ou tenho que te dar uma palmada?"

Ficou quieto de repente, saltou para o meu colo, no sofá, e perguntou-me com um ligeiro sorriso, vestido de espanto:


"Foi o teu pássaro da alma que abriu a gaveta de estar zangado?"


Foi a minha vez de experimentar o espanto. Apanhada completamente de surpresa, não conseguia perceber se estava a tentar distrair-me a atenção do que me tinha feito zangar ou se estava simplesmente a "mangar" comigo...


"Tu não penses que me fazes esquecer a palmada. Ora volta lá a fazer a mesma asneira e vais ver se há pássaro que te salve... Ai, ai, ai""Mas tu não me respondeste. Foi o teu pássaro da alma?"

"Mas que conversa é essa?"

"Então tu não sabes que vive um pássaro dentro de nós? Oh, mãe, eu conto-te!Ele chama-se Pássaro da Alma e vive num sítio muito fundo, dentro do peito das pessoas... foi a Mafalda que nos contou hoje..."

"E esse sítio é...?"
"É a nossa alma, mãe! E lá, no fundo dela, há muitas gavetas... a gaveta de estar zangado, a gaveta de ficar contente, a de ter sono, a de ter fome, a de ficar triste, a de chorar... e até há gavetas de ter vontade de dar coisas às pessoas!"

" Que coisas, filho?"

"Beijinhos... queres um? Se eu te der um beijinho pode ser que o teu Pássaro da Alma feche a gaveta de estar zangado..."


Olhei bem no fundo daqueles olhitos expectantes e não consegui disfarçar a ternura de um sorriso. Nesse momento, senti no fundo do meu peito o movimento de uma velha gaveta a fechar... e o crescer de umas asas que me impeliram a voar ao mundo do meu menino-homem que, ainda no meu colo, esperava ansiosamente uma resposta minha, como se essa fosse a confirmação da veracidade daquela história lindíssima, contada pela Mafalda! Abracei-o devagarinho, muito devagarinho para que tivesse tempo de perceber a imensidão do meu Sim... e sosseguei-o:


"O Pássaro da Alma já fechou a gaveta de estar zangado, mas disse-me que voltava a abri-la se tu fizesses asneira outra vez... Por isso vamos lá a pensar os dois no que havemos de fazer para o Pássaro só abrir as gavetas das coisas boas... O que achas?""Mas eu sei! Olha, não podemos trancar as gavetas sem ele ver porque essas gavetas não têm chaves, mas podemos ter vontade de fazer as coisas bem e o Pássaro da Alma passa as coisas boas para as gavetas de cima e esquece-se das gavetas de baixo, onde ficaram as coisas más... Ele gosta de beijinhos e tu também. Eu dou-te muitos beijinhos, não faço asneiras e pronto!

"Combinado! Vamos lá ajudar o Pássaro da Alma a arrumar as coisas boas nas gavetas de cima! Dá cá um beijo grandeeeeeeeeeeee!"


Agora já entendo os ruídos da Alma nos dias cinzentos... 


É o Pássaro da Alma a arrumar as gavetas! Logo que se esquece das debaixo, a alma serena e a paz invade-me! Eu pedi-lhe que reservasse a gaveta mais acima de todas para colocar lá estes momentos doces da minha vida... e que a deixasse sempre aberta!...

Composição de Cris (Do Fundo do Meu Arco-íris)

quinta-feira, janeiro 05, 2006

nascimento do Menino

óleo de Margarida Cepêda (pormenor de quadro)


A Rosa como símbolo da abertura do Coração

A Rosa que está no centro é o ponto de confluência entre "o que está em cima" e "o que está em baixo" .
E o que está em cima é o Sol, e o que está em baixo é a Terra.
O Coração está entre a Terra e o Sol,tal como a Rosa.
O que nasce a partir do centro do Coração, pela actividade do Amor e do Conhecimento, é o Menino .
Este é o Natal.

É no duplo movimento do "saber dar" e do "saber receber" que o Caminho Iniciático começa e conduz ao Nascimento.

Saber Amar abre muitas portas

Poema e imagem de
Maat in Arde o Azul

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Natal...


Presépio em roda de madeira


Natal, a tal
época das luzes,
dos enfeites, dos presentes
ausentes
das casas vazias
das mágoas perdidas
em colos de amargura.
Natal, sinal
de paz incapaz
de esconder
as lágrimas frias
das estrias da dor,
das crianças sozinhas
dos velhinhos abandonados.
Natal de cor, incolor
do cinzento
pensamento,
nas vaidades
das sociedades
em cerimónias
de solidariedades.
Natal viral
de um vírus do amor
onde tu e eu
somos actores,
num palco de cor
de comodismo
de olhos vendados
às verdades,
das cidades, dos países
Natal esse que tal
que te enche a mesa
de excessos que abandonas
em caixotes do lixo
rebuscados
pelos enfeitiçados do nada.
Natal, uma viagem
de contrastes
de muitas artes
de tudo e de nada!

Poema e imagem de Imar in Fala B (a)ixinho

terça-feira, janeiro 03, 2006

Está prestes a acabar




Está prestes a terminar
O Natal deste ano
A muita gente vai faltar
Dinheiro para o fim do ano

A euforia foi visível
Nas áreas de comercialização
O negócio foi possível
Mesmo em tempo de recessão

Não é pois compreensível
Este fenómeno consumista
Numa atitude irreversível
De quem anda a dar nas vistas

Muitos não se querem privar
De festejar a passagem de ano
Vão-se mesmo aperaltar
Nos restaurantes dançando

Depois surgem os lamentos
De quem não sabe controlar
Os seus escassos proventos
Que nem chegam para o lar

Entram pois no novo ano
Aumentando a sua divida
Nem se lembram estar gastando
Duma forma desmedida



Poema de Contradições in Insinuações

segunda-feira, janeiro 02, 2006

O Natal pelos olhos da criança…


deixo-vos um delicioso poema que encontrei no Blog 
Sombra do Deserto



O Natal inocente


Natal é uma menina,
que me vem dar a mão.
Natal é o Pedro e o João.

Natal é dar um beijo,
pela manhã ao pai e à mãe.
Natal é dar amor a quem
o quer e não tem.

Natal é lá na escola,
quando todos dão as mãos,
abrem a sacola e repartem
o seu pão.

Natal é ÀÀÀ, III, óóó.
Natal é não estar lá.
É estar aqui e não estar só.

domingo, janeiro 01, 2006

Não vamos fingir por ser Natal...

Presépio de lata in Que bem cheira a Maresia


já não tocam os sinos
nem cantam as vozes
agora suplicam crianças
e adultos
todos querem
querem prendas
e esperam dádivas
não rezam
nem demonstram fé
consomem
consomem o que não querem
o que não lhes serve de nada
desejam tudo
tudo o que vêm
cobiçam com olhares
depois compram
compram tudo
movidos pela vaidade
e pela alienação
parecem saqueadores
talvez o sejam
dos seus próprios tesouros
depois discutem
pelo meio falam em paz
mas discutem
de tanto consumir
de tanto desperdiçar
discutem
até ao fim discutem
por vezes ainda se dão conta de si
nessa altura são solidários
são altruístas
e redentores
querem ser deuses
heróis do seu próprio ego
basta-lhes vencer por um dia
no que será um desejo comum
depois esquecem
seguem os seus rumos
como se tudo fosse apenas um sonho



Nota: O autor deste Poema José Gomes Ferreira, é homónimo de um Grande Poeta Português José Gomes Ferreira, e é titular de um Blog a conhecer o Labirinto de silencios

sábado, dezembro 31, 2005

Nasceu em Belém...

Continuando com a publicação de Poemas de Natal, oriundos de vários Blogues Portugueses, até ao próximo dia de Reis, venho deixar o meu abraço carinhoso e que tenham um

FELIZ ANO NOVO


O nosso Menino Jesus
Nasceu em Belém
Nasceu tão somente
Para querer o bem
Nasceu sobre as palhas,
O nosso Menino
Mas a Mãe sabia
Que ele era divino
Gloria, gloria in excelsis deo.

Poema e imagem de Bona Musica

sexta-feira, dezembro 30, 2005

Noite de Consoada...

Imagem de Ricardo Biquinha
in Luz.de.Tecto




Cozi o bacalhau,
As batatas, as couves
E o ovo a acompanhar.
Coloquei a toalha azul na mesa,
Guardanapos de papel a condizer
Garrafa de vinho aberta, do Dão,
E o copo à sua espera.
Olhei à volta e sorri…
Estava rodeado de pessoas
De quem eu gosto:
As minhas filhas, os meus sobrinhos
E os que sempre comigo estiveram:
Os que nunca me abandonaram!
Mesmo só senti-me acompanhado!
Olhei novamente e reparei que não havia maldade
Invejas ou hipocrisias;
Nem mirones a ver a qualidade das prendas,
Nem o número das que se ofereceram,
Ou se receberam…
Servi-me:
Estava branca, a posta do peixe "natalício", deliciosa,
Vos juro!
As couves a acompanhar e as batatas ao lado,
O ovo…Ah! As cores do ovo!...
Azeite alentejano, este ouro líquido e vinagre qb.
Sentei-me!
Fiz um brinde às pessoas especiais que trago sempre comigo
E não deixo em lado nenhum…
Coloquei a mão no peito, morada de quem amo.
Brindei à alegria, à honestidade e à força de lutar.
Não me esqueci de ninguém!
Comi umas fatias de queijo saloio
E rematei com um pouco desse vinho:
Alegre, revigorante, quente!...
Bebi o café e, não sendo hábito, bebi um digestivo.
Novamente um brinde a quem me acompanhou.
Um jantar de consoada em que me revi, reli e redescobri.
Meditei na vida, nos objectivos, nos azares, nas sortes…
O pai natal esteve longe mas com tanto para fazer…
Para o ano caber-me-á ser um dos contemplados.
Sorri novamente e antes de me levantar
Sorri também aos que guardo em mim.
Fui dar uma volta e deleitei-me com as cores das luzes reflectindo na baía.
Sorrateiramente olhei o céu:
Nublado e nem uma estrela (cadente) me deixou ver…malandreco!
Regressei a casa, sereno e preparei a deita.
Um bom dia de Natal para todos
E que seja sempre dia de Natal porque eu
Brindar-vos-ei sempre…
todos os dias!...



quinta-feira, dezembro 29, 2005

Revisitando O NATAL...



Natal
É ser
É nascer
É dar-se
Dar-se é ir de porta em porta
com uma mensagem
de flores no sorrir
e estrelas nos olhos.
Uma ponte de palavras
formada
entre ti e os outros,
construída, encontrada
entre a vida, o amor e a morte.
Natal
é seres, em cada dia, não de ti, mas de todos.
Universo novo não planeado,
não programado, mas vivido e amado,
num desejo constante de ternura-dádiva, de fraternidade.
Natal é ser criança cada dia em cada ventre de mulher. 

Todas as mulheres
TUA MÃE



Poema de TMara
in Círculo de Poesia



Imagem Pessoal da autora do Blogue

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Natal... Luz...






Luz
Luz do fogo
Aquece meu corpo
Com a Força do teu calor
Para o manter activo
No trabalho, na saúde e no rigor.

Luz
Luz da vela
Aquece e ilumina minha alma
Com a Beleza da tua chama
Para quebrar a ira e o apego que me trama
E fazer raiar a alegria, o amor e a calma.

Luz
Luz da Estrela
Ilumina o meu mental
Com a Sabedoria da tua Graça
Para abolir as fronteiras que o ego meticulosamente traça
E resplandecer a Faúlha do Uno que tudo abraça.



Poema de Jorge Moreira