sexta-feira, abril 13, 2007

De Amor escrevo...


Fotografia de Haleh Bryan


De Amor escrevo, de Amor falo e canto;
E se minha voz fosse igual ao que amo,
Esperara eu sentir na que em vão chamo
Piedade, e na gente dor e espanto.

Mas não há pena, ou língua, ou voz, ou canto
Que mostre o amor por que eu tudo desamo,
Nem o vivo fogo em que me sempre inflamo,
Nem de meus olhos o contino pranto.

Assi me vou morrendo, sem ser crida
A causa por que em vão mouro contente,
Nem sei se isto que passo é vida ou morte.

Mas inda da que eu amo fosse ouvida
E crida minha voz, e da vã gente
Nunca entendida fosse minha sorte!


(Soneto I de Pêro de Andrade Caminha in "Poesias Inéditas")

sexta-feira, abril 06, 2007

Continuando... Primavera...

Fotografia de Carlos Neto


Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma
Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.
Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.

(Alberto Caeiro in "Quando Vier a Primavera")

Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)





domingo, abril 01, 2007

Abril... Primavera...


Pintura de Arthur Hughes


Namorou-se uma princesa
Dum pajem loiro e gentil;
Chama-se ela – Natureza,
Chama-se o pajem – Abril.

A Primavera opulenta,
Rica de cantos e cores,
Palpita, anseia, rebenta
Em cataclismos de flores.

(...)
Tudo ri e brilha e canta
Neste divino esplendor:
O orvalho, o néctar da planta
O aroma, a língua da flor.

Enroscam-se aos troncos nus
As verdes cobras da hera.
Radiosos vinhos de luz
Cintilam pela atmosfera.

Entre os loureiros das matas,
Que crescem para os heróis,
Dá o luar serenatas
Com bandas de rouxinóis.

É a terra um paraíso,
E o céu profundo lampeja
Com o inefável sorriso
Da noiva ao sair da igreja.


(Poema de Guerra Junqueiro
in Tesouro Poético para a Infância, antologia)


Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

terça-feira, março 20, 2007

Aguardando a Primavera...


Sandro Botticelli - "La primavera" (1482)


Já se afastou de nós o Inverno agreste
Envolto nos seus húmidos vapores,
A fértil Primavera, a mãe das flores
O prado ameno de boninas veste.

Varrendo os ares o subtil Nordeste,
Os torna azuis: as aves de mil cores
Adejam entre Zéfiros e Amores,
E toma o fresco Tejo a cor celeste.

Vem, ó Marília, vem lograr comigo
Destes alegres campos a beleza,
Destas copadas árvores o abrigo.

Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Quando me agrada mais estar contigo
Notando as perfeições da Natureza!


Poema "Convite a Marília" de Manuel Maria Barbosa du Bocage
Sonetos-Ed.Europa América(Pág.38)



Dedicado ao Dia Mundial da Poesia


Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

quinta-feira, março 15, 2007

Não te amo


Pintura de Louis Icart


Não te amo, quero-te: o amar vem d'alma.
E eu n'alma --- tenho a calma,
A calma --- do jazigo.
Ai! não te amo, não.

Não te amo, quero-te: o amor é vida.
E a vida --- nem sentida
A trago eu já comigo.
Ai, não te amo, não!

Ai! não te amo, não; e só te quero
De um querer bruto e fero
Que o sangue me devora,
Não chega ao coração.

Não te amo. És bela; e eu não te amo, ó bela.
Quem ama a aziaga estrela
Que lhe luz na má hora
Da sua perdição?

E quero-te, e não te amo, que é forçado,
De mau feitiço azado
Este indigno furor.
Mas oh! não te amo, não.

E infame sou, porque te quero; e tanto
Que de mim tenho espanto,
De ti medo e terror...
Mas amar!... não te amo, não.


Almeida Garrett in Folhas Caídas(1853)

sexta-feira, março 09, 2007

Nascemos para amar

Por diversas vezes me interrogaram dos meus gostos poéticos e que este não deveria ser somente um blogue dedicado à poesia da blogosfera mas sim, a toda a poesia de expressão de Língua Portuguesa.
De forma alguma abandonarei a poesia dos blogues, mas durante algum tempo irei aqui partilhar muitos outros autores…


Imagem de Dante Gabriel Rossetti



Nascemos para amar; a humanidade
Vai tarde ou cedo aos laços da ternura:
Tu és doce atractivo, ó formusura,
Que encanta, que seduz, que persuade.

Enleia-se por gosto a liberdade;
E depois que a paixão n'alma se apura
Alguns então lhe chamam desventura,
Chamam-lhe alguns então felicidade.

Qual se abismou nas lôbregas tristezas,
Qual em suaves júbilos discorre,
Com esperanças mil na ideia acesas.

Amor ou desfalece, ou pára, ou corre;
E, segundo as diversas naturezas,
Um porfia, este esquece, aquele morre.

(Bocage in "Obra Poética" 1997)

sexta-feira, março 02, 2007

Hoje não há Poesia...

Junto-me aos que procuram o CHIP, a ÍSIS e a NUT pertencentes a Teresa Durães do Blogue Voando por aí


Chip


Nut


Isis


Desapareceram segunda-feira (19 de Fevereiro) passada entre as 17h30/18 e as 19hH00 do Montijo, um Cocker Spaniel dourado (2 anos), Pastora Belga Malinois (2 anos), Pastora Alemã arraçada de Husky.

Tanto a pastora belga como a arraçada pastora alemã têm chip. O canil do Montijo já foi contactado.

A quem os encontrar ou souber do seu paradeiro, por favor contactar a
Teresa Durães que se encontra profundamente triste com este desaparecimento.

GRATA pela ajuda que possam prestar.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

levo-te ao azul


Fotografia de Patrick Wecksten


de partida para um lugar com telhados de silêncio
levo-te para não morrer nos braços exaustos do vazio
vais comigo com a tua mão desconhecida
a pontuar cada segundo de saudade
levo-te como se transportasse um segundo coração
oxigenado pelo que há-de vir
um fato de mergulhador
para tocar a mais secreta estrela do mar
cingida por algas
levo-te porque nenhuma palavra pode encher
este vaso de sol que desponta
em cada palavra tua
levo-te às cavalitas do sonho
na adolescente fogueira
onde ardem todas as sebes
todos os limites
levo-te em contramão
para transgredir docemente
as estradas e ruas e caminhos
os desejos de sentido único
levo-te simplesmente porque
tu és o meu farol que varre
todos os poros interditos
uma vela ao rubro
na mais fechada escuridão
levo-te no verso inacabado
porque o poema só
termina
quando acordares a meu lado



(Poema de Alberto Serra in vinte anos )

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Dança


The art of Ballet by Tonny


Para quem danço?
Nem eu sei....

Danço com as palavras, com as mãos, com os olhos
Danço sozinha no meio das gentes
Danço nua, vestida de azul, ou de negro e até de vermelho já me cobri.
Danço a rir e a chorar
Danço a sonhar
Até quando amo, eu danço.

Vivi sempre a dançar, mesmo parada no meu canto
Dançarei sempre, mesmo que a música se cale
Ensaiei passos diferentes para acordes vários
Em alguns, tropecei, até caí
Mas sempre a dançar, nunca desisti
E retomava os passos novos que aprendi
Porque a dança é vida e quando eu parar
É porque morri!

Se é para ti que eu danço?
Danço para mim!
Mas esta noite, sim, a minha dança foi para ti!

(Poema de MT in Vivências)

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

eu faço o ninho


Pintura de Jaoni


quando as palavras têm o peso de um passarinho
eu faço o ninho
num canto do teu sorriso
alongo o olhar pelos pêlos dos teus braços
que são só braços
a luzirem ao luar
deixo-me entreter devagar
na paródia de uma história
num desfiar da memória

é leve e brilha a pupila
cintila levita sem ciso que me prenda
é só renda a rendilhar
brincamos no faz de conta
tu és quem conta eu sou a tonta
até o dia clarear

depois
jogamos palavras com emoção mais pesadas
espreitando nelas as margens do voo a saber voar

assim vamos
construindo coisas simples sem destino
imos novos novos rimos
sabemos nada assim vimos
sozinhos somos num par

(Poema de MJM in Silepse)

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Escrita


Pintura de Susan Rios



Na folha lisa e escorreita,
O lápis afiado e porfiador
Elabora percursos mansos
Em sinuosas ruas que se espraiam.

Escrever é desagrilhoar
O pó da memória em vão acumulado
E gritar,
E dizer alto,
Que revolta nos acomoda o peito,
Que afago nos acaricia a alma.

Escrever é arrojar o Futuro.
Ao alcance de um artigo,
De um pronome,
De um verbo.
Verbo é “criar”,
O início de tudo,
A sedição,
A ociosidade das palavras.

Tresfolgo a escrita
De um trago.
Acre, por vezes,
Libertador, sempre.

O ar está abarrotado de palavras.
As mais infalíveis estão, contudo,
Em bolsos de pequenas crianças,
De mãos rosadas e roliças,
Que as retiram em movimentos loquazes
E as levam à boca como rebuçados
Inspiradores da candura da infância.

Tu, Criança,
És quem melhor descreve o mundo,
Porque és a vagem verde viçosa
De uma aurora que não distingue nuvens.

(Poema de Filipe Lamas in Tretas & Letras)

sábado, fevereiro 17, 2007

Tempo


Óleo de Alfred Gockel



Não questiono a vigília,
Mas não a procuro...
Quando cruzo os céus e os mares
À procura de respostas
Voo contigo
Num estado de delírio que me quiseste dar...
Não sei quem comanda o sonho
(Ou o sono)
Mas sei que torna a viagem mágica!
Vejo-te mudo
Através da vidraça empoeirada pelo tempo...
Esfumas-te por instantes
Num tempo para lá do tempo,
Tomas a forma de um corpo...
Revejo a tua face e o teu sorriso,
Reduzo a distância,
Nos teus braços,
Ao zero absoluto!


(Poema de PoesiaMGD)



Em tempo: O meu agradecimento a Maramar(T.E) (deixado num comentário) pela indicação do autor da tela, que não tinha conseguido identificar.

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

O Amor é...


Pintura de Diego Manuel Rodriguez




O amor é o portador de todas as canduras,
É o escorrer do mel em nossas bocas,
É o sentir-te ao levantar
E deitar-me contigo em mim!

É o viver os sonhos adocicados,
A tremura no corpo,
As mãos gélidas,
É o bater do coração desenfreado…

É o conhecer o teu corpo ao detalhe,
E amar a todo o instante,
Com cada suspiro,
Como se fosse o último minuto da eternidade.

"Butterfly e Vero"

Poema vencedor do desafio lançado no blogue Enquanto houver Tempo... (MJ)

Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Atracção


Fotografia de Stanmarek


Gosto desse teu olhar desarmante,
De engate…
Dos teus gestos insinuantes quando cruzas as pernas pedintes.

Das tuas mãos delgadas e provocadoras,
Burilando na areia propositadamente sensuais,
Dos sorrisos que me acertam como flechas envenenadas,
És uma bela ratoeira com forma de mulher de outros murais.

O teu cabelo confunde-se com a areia dourada,
Acenando-me constantemente, bandeira ousada.

E não consigo desligar meus olhos de ti fêmea traquina,
Meus sentidos perdem-se em robustez como ondas nas rochas,
Espólios de ânsias se acentuam no frenético desejo de colorir tuas coxas,
Silhueta ondulante,
Vou levantar asas e sobrevoar-te!...



(Poema de Carlos Reis (In_loko) in Letras Pinceladas)



Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Quem sou eu?

Pintura de Juanito Calaveras



Foi então que parti à procura
De segurança e sabedoria
Tremendo ao sentir a’margura
Que a nova ignorância trazia

Mas que mente esta que tortura
Que martela a todos os momentos
Que pinta de amena loucura
Os mais inocentes sentimentos

Mas quem sou eu afinal
Que jovem já não sou
Se o corpo dói e passa mal
Do tempo que por ele passou

Quem sou eu afinal
Se a alma vendi
Ao grande vendaval
Dos dias que perdi

Filho, irmão, pai, marido
Sou sempre de alguém
Haverá em mim escondido
Algo meu e de mais ninguém?

Algo mais que esta figura
Alta, magra e desligada
Que perde a compostura
Sempre que é acossada

Alguém a quem se possa
plantar um chavão que seja
Doutor da pasta grossa
Estúpido de fazer inveja

E perante o fim vizinho
Morre a vontade sem o saber
Ou segue um errante caminho
Até Deus ou até o que houver

Que fazer à vontade de mais ser
Quando os anos se vão escoando
Devo reprimir o desejo e me perder?
Devo levantar âncora e sair errando?

Se me perco, me encontram
Se me encontro, desapareço
Se fico, os de alguém terão
Se vou, só eu permaneço



(Poema de Pedro Azevedo in O Zigurate )


Ouvir o poema na voz do Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

O invendável...


Imagem Google


Ah, maldito Tempo,
que me vais matando,
com o tempo,
a mim, que não me vendi.
Se fosses como o vento,
que vai passando,
mas vendo,
mostrava-te o que já vi.

Não queres ver,
eu sei!
Contudo, vais ferindo
e remoendo,
como quem sabe morder,
mas ainda não acabei
nem de ti estou fugindo,
atrás dos que vão correndo.

Se é isso que tu queres,
ir matando,
escondendo e abafando,
não fazendo como o vento:
podes fazer e não veres
aqueles que vais levando,
mas a mim!? Nem com o tempo!


(Poema de David Santos in Só Verdades)

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Mudança...


Imagem de autor desconhecido



Mudei o sopro do vento,
Sopra agora para sul,
Mudei a cor do céu,
Está pintada em tons de azul.

Mudei o cheiro das flores,
Têm agora novo perfume.
Mudei o coração dos homens
Que emanavam azedume.

Mudei o meu olhar sobre o mundo,
Ganhei força e nova vida.
Mudei a minha forma de ver,
Esqueci e fui esquecida.

Mudei o meu coração
E decidi de novo amar
Mudei o que de pior tinha
E estou feliz só por mudar.



(Poema de Vera Silva in Palavras Soltas)

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Reencontro...

Imagem autor desconhecido


Assim me queiras tu que, por meu lado
Não vou deixar de amar-te, nunca mais,
Ainda que os dislates do passado
Nos tornem mais diferentes do que iguais.


Nasci para te amar e ser amado
Por ti, que me fizeste recordar
Distantes horizontes do meu fado,
Tão cheio dos azuis de céu e mar.


Nem tudo está perdido, no meu mundo,
Enquanto eu encontrar, no teu sorriso,
A força e o carinho, que preciso.


Serei feliz até, cada segundo
Que vir, do teu olhar, a ansiedade
Sair p'ra dar lugar à f'licidade.


(Poema de Vitor Cintra)

quarta-feira, janeiro 31, 2007

manda embora a solidão...


Imagem de Nick Knight



Da transparência das palavras germina espontaneamente a alma de quem as escreve...



Demorada a noite
aperta-me nos seus braços
e fala-me baixinho
de espaços
onde os sonhos se elevam aos sentidos
e
unidos
somos pedaços
e momentos
perfeitos...


Terna a noite
segreda-me os corpos suados
colados
em beijos perdidos
e
no bailar dos gemidos
relembra-me as mãos
soltas
livres
como pormenores inconscientes
da ausência de privação...


Incendeio...
transbordo de ti...

Sente-me!


(Poema da Cris in O sorriso da lua...)

segunda-feira, janeiro 29, 2007

querer ser, e crer

Almaro com a Poesia no olhar, diz-nos estas palavras: Não sou fotografo. uso uns olhos e um sentir. sou navegante vagabundo que só leva olhar no ir...

Pintura de Almaro



não queira eu
ser
mais que eu-próprio
mas,
ser-me,
escondido-por-inteiro,
nos olhos de menino
que sonha,
ser
cavalo-marinho, abraçado em ondas-de-azul-horizonte,
desenhado,
sem papel
ou
pergaminho,
fabricado,
não
em pele
ou
papiro,
mas em lágrimas de fada-sininho,
e
sedas,
em cor-de-sol-quando-se-deita-baixinho…

(Poema de Almaro*)

* Poeta, pintor e fotógrafo amador...