quarta-feira, janeiro 16, 2008

Nós, os outros


Imagem daqui


Nós, os outros, habitamos a textura
aquosa e impura da cidade adormecida
quando o negro nela se abate

Nós, os outros, abrigamos o frio
nos jornais remexidos,
aninhados no vazio dos recantos
que o cimento e a pedra calam

Somos gente sem nome nem destino
em tempo indeterminado;
andarilhos na mão que se estende,
vestidos de invisibilidade

Nós, os outros, também sonhamos
a metáfora ténue dos papeis gastos,
da vida a essência dos dias plenos
entre a existência dos muros lentos
levantados pela hibridez da hora em viragem

Assim caminhamos o esquecimento
sob a trama da luz baça da cidade


(Poema da Amita in Branco e Preto)

domingo, janeiro 13, 2008

Começar 2008...

No iniciar de mais um ano, em que esta página sobreviveu pelo apoio e carinho que os seus frequentadores têm demonstrado por ela, é tempo de reviver e criar novos alentos.
O Poesia Portuguesa nasceu da partilha das palavras que mais lhe tocaram e que ia descobrindo, em blogues de língua Portuguesa.
É tempo de voltar a essa partilha e, continuar a alimentar sonhos e esperanças…


Imagem Google


quero sonhar
acordar e saber que sorriste
quero amar
e pensar que amar é saber que da dor caíste
hummm, queria provar o sabor da minha infância
correr, correr e não mais crescer
das pedras calcadas pelo calor saber delas beber
como é bom ser sonho de criança

tou sozinho
mexo-me e sinto-me vivo
é tão bom esse teu néctar
esse teu desejo infinito de saber a magia
penso em ti
mexeste onde tou sozinho
nos meus pensamentos desertos
quero-te assim
onde meu navio parou
parou num tempo sem vela
e sem rumo e que só te quer bela

mas como não posso parar digo-te
ou digo-me a mim
que a noite tem esperança
que o tempo pode ser meu
que os desejos podem viver em prazeres
que o vento que se descobre a ele próprio é vivo
e que o amor parecendo banal, pode ser infinito

"suspiro"a quem te enganas
ela dançou para ti
e não foste capaz de dizer simplesmente
que naquele momento a amaste sem fim...


(Poema "Desabafo" do Poeta Vagabundo)

terça-feira, janeiro 08, 2008

Mulher


Pintura de Gustave Coubert


nos momentos de incerteza
quando apetece fugir
e desistir da viagem

quando cansado de tudo
me sento à beira da estrada
e adormeço a coragem

são os teus gestos
mulher
que me chamam
para a vida

e sinto de novo a fúria
de desenhar um país


(Poema de Vieira da Silva)

domingo, dezembro 30, 2007

Outro Ano...






Contei quantos anos tem um dia
Adormecido à porta da madrugada
em esperas vãs cansadas de agonia
tomba o dia, o ano, nesta estrada...

entra outro, o novo...o desejado
a fervilhar em taças de ilusões
e diz o velho na folha do passado:
- conseguirás tu, trazer as soluções?

tal como tu, nasci com espirros de luz
e termino no delírio da'nsiedade
do sentimento humano que traduz
o sonho de uma nova realidade.

benditos os anjos de asas quebradas
morrem sem glória e o mundo esquece
numa taça de quimeras deslumbradas
como fumo, porque o fumo, não aquece...

deixo espelhos sombrios em herança
ruínas, guerras, fome, má bonança,
catástrofes, desventuras doloridas,
lágrimas sufocadas, mãos estendidas

e as promessas, são rosários lentos
nas mãos de quem luta dia-a-dia.
retira 2008 a cruz do desalento
dá à vida, sol, saúde, amor e alegria

ser novo ou velho...pouco importa
se houver no mundo, pão, paz e harmonia
e o direito ao sol em cada porta
para a noite desta estrada... se fazer dia.



(Poema de Teresa Gonçalves)


quinta-feira, dezembro 20, 2007

O Natal aproxima-se...


Natal do nascimento do Menino, que desde muito pequenina em casa do meu avô, me acostumei a ver deitado nas palhinhas e também, durante muitos anos, em casa dos meus Pais.

Desses Natais, guardo memórias infindáveis, de outro Menino em palhas deitado...


Seguindo a tradição, continuei a deitar o Menino nas palhinhas todos os Natais, pensando em quantos meninos, nem palhinhas tinham para se deitar.


Mas em todos os Natais, cada vez menos se recorda o M
enino, nem o motivo pelo qual ele nasceu, sendo prioritário o consumismo que se gera nesta época.

Por isso, quando hoje acordei com vontade de aqui colocar um poema de Natal, recordando o Menino que já nasceu, dei a minha habitual volta pela blogosfera, em busca de palavras que me fizessem sentir o verdadeiro espírito do Natal... não aquele espírito comercial, que leva a compras desenfreadas, a trânsito interminável, a troca de prendinhas quase obrigatórias, entre familiares, que por vezes, só para o próximo Natal é que se voltam a encontrar, mas aquele espírito que eu sentia há anos, quando me contaram porque motivo o Menino tinha nascido...

Ao final do dia, descubro uma pequena maravilha, que me atrevi a "roubar" à
Maria Pedrógão, da Casa de Maio e que me fez recordar os cânticos de Natal da minha infância e que aqui vos deixo…

Toca o sino pequenino
Toca o sino pequenino
Sino de Belém,
Já nasceu o Deus Menino
Que a Senhora tem.

É Natal, é Natal,
Vamos sem demora,
Já nasceu o Deus Menino
Que a Senhora adora.





Presente de Natal
Quero que todos os dias
Sejam dias de Natal
Para todos terem alegria
E a ninguém lembrar o mal

Ò menino! Não te esqueças
De me dar um presente
Transforma todos os dias
Em Natais p'ra toda a gente.

Em Natais quentes de amor
Com cestos cheios de pão
Com homens todos irmãos


(do Cântico tradicional)











sábado, dezembro 15, 2007

A amizade e a ternura aumentaram - Pág 161

Confesso que me senti deveras envergonhada quando hoje, com um tempo (pouco) livre para mim, decidi visitar alguns dos blogues que tenho tido curiosidade (feminina) de saber o que têm postado, durante esta minha já longa ausência deles.
E senti-me envergonhada porque, a
Júlia Moura Lopes, do blogue O Privilégio dos Caminhos, fez o favor de citar o Poesia Portuguesa numa corrente, "O Meme da página 161" e só agora desse facto tive conhecimento, que com prazer aceito e, passo a referir as regras do mesmo:

1ª) Pegar um livro próximo (PRÓXIMO, não procure)
2ª) Abrir na página 161
3ª) Procurar a 5ª frase completa
4ª) Postar essa frase no seu blog
5ª) Não escolher a melhor frase nem o melhor livro
6ª) Repassar para outros 5 blogs.

O livro que tenho aqui mesmo ao meu lado, porque o estou a ler, é o livro de poemas de Natércia Freire, intitulado Poesia Completa, com Prefácio de Maria Gabriela Llansol, das Edições Quasi.
Abro a referida página 161 e deparo-me com um poema que gosto muito, intitulado “UM SÓ DIA”.
Infringindo a terceira regra da corrente, permito-me transcrever uma das partes do poema que mais gosto, da já citada pág. 161:


Pintura de Héctor Becerini


"Ao sol, ao raio de oiro da manhã.
Ao vento, à comoção dos seus sentidos…
À rajada que desce da montanha,
Ao orvalho do sonho, à impaciência
Do seu beijo macio,
Ao fluir de rio
Em sucessiva ausência…
À palavra pequena, ao som de búzio
Que vem do grande mar
E no ouvido se alonga e se insinua
- posse, algema, vertigem
Que a flor vai navegar…"

(excerto, poema de Natércia Freire)

Passo o testemunho a 6 blogues:

As velas ardem até ao fim
Carlos Peres Feio
Des-encantos
Diogo Ribeiro
Dulce
Piedade Araújo Sol


Imagem de autor desconhecido

domingo, dezembro 09, 2007

anseio a noite...


daqui


anseio a noite
o sono o sonho
suspensa a confusão da luz
cravo as mãos no corpo
atingir o interior do rio
longe das vozes do dia
acaricio a música
o correr das águas
no leito novo
a quietude do coração
adormecido na margem


(Poema de
Memória Perturbada)

terça-feira, novembro 20, 2007

O Mar...

E porque o Mar foi tema de destaque, no blogue Porosidade Etérea da Inês Ramos, deixo aqui os poemas que foram seleccionados para serem gravados em áudio…


Fotografia de Pedro Moreira (Meia-laranja, Praia da Granja)



Penélope fala a Ulisses, ou outras falas
1.

Cala-te, tu,
de voz de azul harpia
e deixa-me que eu ouça outra vez o Egeu,
as ondas sufocadas,
as sereias cantando,
e um riso que foi meu junto de tanto mar

Deixa que ouça outra vez a sua voz
e silencia o tom de azul harpia,
agora,

que o meu amigo fala,
e a memória que dele se desprende
só me pode rimar com o que tenho agora
e é demais conhecido ao longo desta língua,
a minha língua que não é de Egeu,
mas de outro mar mais largo


2.

Deixa-me que registe
por dentro da memória
a sua voz,
que com ela me cheguem
mil Cretas e soluços de sereias,
Minotauros brincando pela praia,
livres como meninos
em castelos de areia e labirintos

Deixa-me a sua voz,
tu, a de azul harpia,
revisitados montes sem idade
nem tempo para amar

3.

Por isso, ao meu amigo, lhe fala a minha língua
de saudade
— rimando no meu mar com o seu mar,
que é outro e tão diferente
e em tempo tão diferente
do azul, que até à exaustão
cantei

Por isso, ao meu amigo, lhe fala
a minha língua de saudade:
de janelas de sol emolduradas em solidões
diferentes,
mas sempre e ao mesmo tempo
e neste bastidor:
a solidão igual –

Ana Luísa Amaral(poema inédito, que será incluído no seu próximo livro)



Ouvir o poema na voz de Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)


Fotografia cedida gentilmente pelo Almaro

Morrer devia ser assim:
lavar a cara com areia fina
e mergulhar no mar adormecido.


Joaquim Alves

Ouvir o poema na voz de Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

O meu agradecimento a Inês Ramos pela disponibilidade e partilha.

quinta-feira, outubro 25, 2007

Campo… de Mar

Há palavras que são momentos… e momentos que não precisam de palavras.
O meu agradecimento à
Cris por este momento que deixou nos comentários e que peço licença para aqui transcrever…


Olhar o mar como se olha para o céu como se olha para o campo...
As estrelas estão lindas, brilhantes, num firmamento trigal.
Os peixes são agora papoilas e as ondas mil flores silvestres, ondulando sob nuvens, vagas de espuma em flor!
E as algas entrelaçam-se, trepadeiras, namorando os astros, quais frutos em árvores frondosas.
O coral é já sol-posto, repousado em rochedos, horizontes sobre oceanos, prados a perder de vista...
Já se adivinha o encanto...

A maré-cheia corre, estende seus braços de água e, transformada em ribeira, ladeia, cantarolando, o imenso areal dourado, qual eira, enchendo-a duma frescura tão marinha, tão campestre!
Brotam os búzios viçosos e as conchas são borboletas, com asas de madrepérola...
E cantam, com voz de aroma de marés vivas, sobre campos azuis, prontos para serem ceifados.
Dormem os pescadores...descansa a faina...sonham que são lavradores...

Veste-se a praia de verde e pede à noite que se junte à fantasia; que lhe traga o vento para com ela bailar ao som da melodia das dunas tão moçoilas, lindas ceifeiras!
Lá longe a montanha sorri e a festa vai durar, estender-se pela madrugada até que o dia os avise que é tempo de recolher porque a noite quer ir deitar-se e o sol-posto vai ser de novo coral.

Descansa o encanto nos braços do dia mas promete voltar!
Trará com ele a noite e será outra vez festa, num campo verde, no mar!
E vai fazer os pescadores dormir de novo, repousando da faina sonhando que são lavradores.
E a praia vai tornar a vestir-se de verde, vai bailar, descalça, com a brisa pelos ombros...
Mas desta vez, num mar que se tornou campo, olhada pelas dunas ceifeiras, nos braços ternos do vento.

Cris in Campo… de Mar

sexta-feira, outubro 19, 2007

O mar tão perto...


São estes os caminhos que percorro diariamente, que fortalecem a minha alma e acalmam o meu espírito.


O mar estava perto,
Fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves,
só alma e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto
puríssimo, doirado.

(Poema de Eugénio de Andrade)



É deste mar que retiro toda a essência que percorre as minhas veias e nele procuro a nascente onde vou beber a minha sede.

(fotos minhas...)

quarta-feira, agosto 15, 2007

...


Imagem Google



Todos os sonhos têm um Fim

segunda-feira, agosto 13, 2007

Ode ao Mar


Fotografia de Sandra V.

Água, sal e vontade — a vida!
Azul — a cor do céu e da inocência.
Um lenço a colorir a despedida
Da galera da ausência...

Mar tenebroso!
Mar fechado e rugoso
Sobre um casto jardim adormecido!
Mar de medusas que ninguém semeia,
Criadas com mistério e com areia,
Perfeitas de beleza e de sentido!

Vem a sede da terra e não se acalma!
Vem a força do mundo e não te doma!
Impenitente e funda, a tua alma
Guarda-se no cristal duma redoma.

Guarda-se purificada em leve espuma,
Renda da sua túnica de linho.
Guarda-se aberta em sol, sagrada em bruma,
Sem amor, sem ternura e sem caminho.

O navio do sonho foi ao fundo,
E o capitão, despido, jaz ao leme,
Branco nos ossos descarnados;
Uma alga no peito, a flor do mundo,
Uma fibra de amor que vive e treme
De ouvir segredos vãos, petrificados.

Uma ilusão enfuna e enxuga a vela,
Uma desilusão a rasga e molha;
Morta a magia que pintava a tela,
O mesmo olhar de há pouco já não olha.

Na órbita vazia um cego ouriço
Pica o silêncio leve que perpassa...
Pica o novo feitiço
Que nasce do final de uma desgraça.

Mas nem corais, nem polvos, nem quimeras
Sobem à tona das marés...
O navio encalhado e as suas eras
Lá permanecem a milhentos pés.

Soterrados em verde, negro e vago,
Nenhum sol os aquece.
Habitantes do lago
Do esquecimento, só a sombra os tece...

Ela és tu, anónimo oceano,
Coração ciumento e namorado!
Ela que és tu, arfar viril e plano,
Largo como um abraço descuidado!

Tu, mar fechado, aberto e descoberto
Com bússolas e gritos de gajeiro!
Tu, mar salgado, lírico, coberto
De lágrimas, iodo e nevoeiro!

* Miguel Torga, in Odes,(1946)


* Poeta, contista, romancista, diarista, ensaísta e dramaturgo, Miguel Torga, de seu verdadeiro nome Adolfo Correia da Rocha, nasceu em S. Martinho de Anta, concelho de Sabrosa, distrito de Vila Real, a 12 de Agosto de 1907 e faleceu em Coimbra a 17 de Janeiro de 1995.

quinta-feira, agosto 09, 2007

Saber Amar


Pintura de Peder Severin Kroyer



Ah! Como é bom saber amar alguém,
ter dentro de si aquele amor ardente,
amar com todo ardor que a alma consente
sem temer ser loucura, mal... ou bem.

Mas há quem se iluda, quem diga que ama...
frouxa luz de candeia que se apaga,
simples amor que esvoaça, que divaga,
deixa morrer no coração a chama.

Amor é tudo o que se dá feito ternura,
é ficar preso d'alguém sem amargura,
sem se sentir como ave em cativeiro.

É o encontro de paixões iguais... sentidas;
depois, duas almas numa só unidas,
duas vidas que se entregam por inteiro.

(Poema de
Maria Teodora in Thornlessrose)

sábado, agosto 04, 2007

O discurso do sol...


Aquarela de Gisele


O sol abriu os seus braços
Mostrou o melhor sorriso
E disse:
Da rotina solta os laços
Ganha tino, ganha siso,
Toma o barco da ousadia
E zarpa rumo ao futuro...
Onde há noite, vai ser dia,
Olhar forte, rosto duro,
Sorriso vestindo esperança
À bolina navegando,
Tens o leme da mudança
Na alma... o sonho brilhante,
O mar, é todo bonança,
Vai, e não olhes p'ra trás...
És a coragem que avança
Porto seguro verás,
E... saciado o desejo,
Ancora no meu olhar
Bem doce... te dou um beijo
E... em ti... vou mergulhar!...

(Rouxinol de Bernardim)

quarta-feira, agosto 01, 2007

Silêncio


Imagem de autor desconhecido


Diz-se o silêncio,
Não são precisas palavras,
Fala-nos por si e no meio de tanta gente,
Faz-nos sentir quanto é premente,
Vencer as barreiras que nos aporta o tempo...

Diz-se o silêncio,
Impõe-se, belisca-nos, agita-nos...
Porque nos mexe na alma e nos morde o corpo
Ao trazer até nós a premência, a urgência,
que nos impele ao outro...

Diz-se o silêncio,
Ele é de ouro ou de prata,
Porque nos eleva,
Mesmo quando a saudade mata,
Sobe em nós a temperatura da consciência,
Ao penarmos pela ausência,
Mas sabemos que há uma memória que cura
e uma esperança que colmata...

(Poema de
Beatriz Barroso in Porosidade Etérea)


Ouvir o poema na voz de Luís Gaspar
(Desligar p.f. a música de fundo para ouvir o poema)

sexta-feira, julho 27, 2007

pedem à palavra


Imagem da mgbon


pedem à palavra
que semeie harmonia
canções
novelos de adubo
em campos fatigados.

pedem à palavra
que socorra
o choro
dos inocentes
nomeie a patente
dos vencedores.
que a palavra
honre
os poetas e as pomposas musas
os políticos e os demagogos
os funcionários e os burocratas
mendigos e feiticeiros.
pedem tanto à palavra.
que a palavra
emigra
foge dos palanques
esgueira-se
pelos canaviais.
deserta.
exausta e presa
na infindável
rede de significados

a palavra apenas pede
que a salves
que lhe dês o teu cheiro
a tua boca
que lhe mates a sede
com a água dos teus olhos.
que a acordes
no mais escuro dos silêncios
na hora mais bravia

pedem à palavra
arremedos
milagres
truques de magia
versos para a fanfarra e para os noivos
rimas de finalistas.

e a palavra
sente
que só encontra significado
lida em ti.
escrita no teu corpo.
palavra que te chama
quando te ausentas.
palavra que te grita
quando o sono
te vence.
palavra que te beija
acaricia, excita
na clandestina leitura
de todos os dias.

(Poema de
Alberto Serra in noites-de-lua-branca)

terça-feira, julho 24, 2007

Perto de Ti


Foto da autora



Estou aqui perto de ti
Embora não me oiças

Regressei do silêncio
Do qual um dia parti

Não sentes o assobio
Do vento na esquina?

O outro lado da vida
Que tua vida não viu


(Poema de Eduardo Graça in Caderno de Poesia )

terça-feira, julho 17, 2007

Paráfrase sobre a "Canção das Canções"


Pintura de Gianni Strino



Desce a noite. Despedi-me dos pastores.
Inebriado pelo perfume do mosto olho para a minha amada.
Surge-me como a aurora, bela como a lua, brilhante como o sol.
Desperta no leito de cedro coberta de penas de pomba.
A mais bela de todas as mulheres extasia-se ao ver-me.
E pelo seu corpo verdejante como floresta perfumada
Pastam rebanhos de gazelas, corços, veados saltaricando na sombra dos seus cabelos.
A sua voz doce de favos, reclama-me e extasia-me.
- Leva-me contigo, meu amado. Ou deita-te a meu lado e canta-me amores.
Sou morena. Sou formosa. Sou tua. Ponho no meu pescoço
O colar de pérolas que exala o perfume do nosso vinho.
Repousa a tua cabeça nos meus seios, no meu ventre de lírios,
Na doçura da minha boca de frutos silvestres,
Quero desfalecer de amor nos teus braços fortes. Conforta-me.
Como és encantador e belo, meu amor. Vamos para o festim da floresta
Que já entoa a chegada da Primavera.
E introduz-me uvas passas na minha boca que espera a tua.
Saboreia a minha saliva e ouve a minha voz que te segreda palavras de conforto
Porque esta noite procurei-te e não te encontrei. Desejo ser tua
Como na primeira vez quando nos encontrámos nos outeiros.
Quero conceber dum amor frenético, penetrante, quente, aromático.
Oh! Meu amado amigo e esposo. Os ninhos já estão prontos.
Escolhamos o nosso.
E faz-me ouvir a tua voz desfalecida quando me abraças e me possuis.
Como são deliciosos os teus afagos, as tuas carícias,
Os beijos com que cobres o meu corpo inteiro. O aroma que vem de ti
Excede o de todos os aromas.
Desfaleço de amor. Os teus lábios são lírios, que destilam a mirra mais preciosa.
Bebe do nosso vinho perfumado, sacia a tua sede de desejo e toma-me.
Leva-me.
Desfaleço de amor mas não tenhamos pressa.
Quando regressarem os pastores
Estamos escondidos na ilha dos amores.

(Poema de
Luís Pinto in Porosidade Etérea)

domingo, julho 15, 2007

Resposta do amigo


Imagem de Pages of Iink


as minhas velas
não ardem até ao fim:

apago-as sadicamente
sufocando-as do ar
com que me consomem
ou esmago o caule da chama
no poço líquido da cera quente

(nas intermitências da luz
e da morte
escondem-se os fantasmas
que abrigo debaixo da cama)

apagadas
deixam-se ficar na memória
acesas e coradas
como uma memória

nunca acendo as velas que apaguei:
extintas não me queimariam

(Poema da
Inominável)

quinta-feira, julho 12, 2007

Em tuas águas...


Pintura de Diji Scales


Em tuas águas navego
Em ti
resumo o périplo
da minha volta ao mundo.
Fora de ti,
não há saída ou rumo
É em ti
que me salvo
... ou que me afundo.
Propício Ancoradouro
amena Enseada
em ti fundeei minha jangada
em tuas águas balouça
o meu escaler.
Fora do teu Mar
eu não sou nada
sou peixe
que estrebucha na areia calcinada
da praia
... até morrer
Em ti criei raiz
Em ti habito
Em ti me reconheço
Em ti palpito
Em ti eu esmoreço
Em ti resisto
Em ti eu caio
Em ti eu me levanto
Em ti eu choro e rio
Em ti eu desisto e recomeço
Em ti eu vivo
... Em ti pereço.
É de ti
que me nutro.
Em ti mergulho
Tu és Partida e Meta
a Flecha e o Alvo.
Em ti se anula e esbate
o meu orgulho
É em ti que me perco
... ou que me salvo

(Poema de
António Melenas)



O meu especial agradecimento à
Sulista pela nova imagem (de Verão) do Profile deste Blogue…

terça-feira, julho 10, 2007

ADEUS, SOPHIA

Passaram três anos sobre a morte de Sophia de Mello Breyner Andresen, ocorrida em 2 de Julho de 2004. Que melhor homenagem do que partilhar aqui, um poema de uma sua admiradora…

Imagem daqui


Por fim, Sophia
desatados os laços
vencidos os limites
estende-te o mar o seu tapete de ondas
como quem estende os braços
Respondes ao convite?

Guardou, só para ti
na tua metade maresia
prodígios, espantos, maravilhas
estranhos como Giocondas…
Esperam-te as ilhas
que sonhaste
E esses corcéis que nunca cavalgaste
sacodem já as crinas
em desafio

Segue o teu fio
de praias extasiadas
de manhãs cristalinas
até que se te acabem as areias
e te venham buscar
breves, aladas
as vagas por que anseias

Vai, ruma ao Norte
desprende-te do Sul
que a tua sorte
não é daqui, é de outro azul

Vai, habitar para sempre o Mar da Poesia

Adeus, Sophia.

(Poema de
AV in Porta do Vento)

domingo, julho 08, 2007

É sempre em Julho






Foi em Julho, que bandos e bandos de gaivotas,
planaram sobre o olhar de tua mãe,
para que ao nascer, herdasses a secreta
violência das marés.
Agora, é sempre em Julho que, dos teus olhos,
se avista um oceano inteiro,
enquanto um navio te cresce, perfeito,
sobre os lábios, soletrando íntimas paragens.

(Poema de
Graça Pires in Ortografia do Olhar)

quarta-feira, julho 04, 2007

Uma sede de rosas...


Imagem de Ivan Kustura


uma sede de rosas.
uma sede tantálica, silenciosa,
como uma brasa ardente queimando.
incendiando as memórias, constante.
como uma inflorescência de cactos abrindo a noite.
cingida de espinhos, o silêncio perfurando.
e a carne.
em labaredas algemada, arfante, felina.
agrilhoada, salina de sangue, vibrante.

na ausência de uma frescura de rosas,
sinal algum pulsa a meu favor.
nem a fresca brisa que afaga os cactos mansos.

a única luz que fulgura e subsiste
é a do fanal do fragoso rochedo
que esquadria as brumas e os mares de escolhos
da minha noite negra povoada de medos:
- a saudade dos teus olhos.

[quem diz que a larga ausência causa olvido,
ignora que a saudade tem memória]


(Poema de
Zénite in Castelos de Vento)

domingo, julho 01, 2007

Mais leves que o destino

Imagem de Lissa Hatcher



Regressámos a pé no sossego da água
mas deixámos na praia um rasto cúmplice
de vento longínquo
alguns sinais de algas
recados e um desejo de repartir sementes

Talvez por isso cheirem a maresia
os poros deste chão
e os nossos lábios soltem pássaros generosos

Talvez por isso tivéssemos regressado
pelas dunas inconsistentes
e finalmente nos descobríssemos
nus e criadores
a voar num império de areias

Hoje quase compreendemos
porque são as aves mais leves
que o seu destino

(Poema de
Eufrázio Filipe in Mar Arável)

quinta-feira, junho 28, 2007

Não me recordo


Imagem de Elena Chernenko


Não me recordo se havia alguma flor
no meu jardim.
Talvez fosse Verão... mas todas as manhãs, ao acordar,
inexplicavelmente sentia saudades de mim.


Só sei chorar em português. Se minha mãe soubesse...
Como detesto os meus brinquedos de criança.
Talvez fosse Verão, e houvesse flores...
Eu é que não fui um jardim na minha infância.


Todos os astros se perderam no infinito.
Que saudades eu sinto de não ter sido um outro.
Talvez fosse Verão, sei lá, e houvesse flores.
Só eu não fui ninguém entre o meu ser
e o sonho de outro.

(Poema de Heitor Aghá Silva)

(in «Nove Rumores do Mar»,
org. de Eduardo Bettencourt Pinto,
Instituto Camões, 2000)

quinta-feira, junho 07, 2007

Porque o descanso é preciso…

Venho já... (imagem pessoal)

Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.

Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez não precisássemos de viver
tanto, quando só o que é preciso é saber
que temos de viver.

Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.

(Nuno Júdice in “366 poemas que falam de amor” pág.311)




Até breve...

domingo, junho 03, 2007

Nome


Imagem de Joel Santos


Não há raças, há seres
Não há religiões, há crenças
Há fome, muita fome
Há doenças imensas
Sem nome

Não há seres, não há raças
Não há crenças nem religiões
Há fome, muita fome
Há doenças imensas
Sem nome

Há tantos seres de todas as raças
Cheios de fome
Armas imensas sem nome
Doenças e tantas desgraças
Com nome

(Poema de João Sevivas)

Nota: Encontra-se aberto no Ora, vejamos...um Concurso de Contos. Basta aceder e… concorrer!

quinta-feira, maio 31, 2007

Preso entre nada...


Imagem de autor desconhecido



Preso entre nada a prender-me,
Na infindável imensidão do não ser,
Atravesso universos que não conheço.
Dilaceram-me esses sóis que sem crepúsculos
Vejo morrer sangrados pelo finito.
Regidas por secretos repousos,
Gravitam em torno do tempo
Elipses forjadas pelo eterno movimento.
Se tento libertar-me, fico pendente
Nas arestas da incerteza.
Quando liberto, o sonho evapora frio
E o absoluto fragmenta-se.


(Poema de Bernardo Bomtempo)

terça-feira, maio 29, 2007

Aos Putos da Beira Rio

O mundo tinha a nossa dimensão:
Reduzia-se às ruas conhecidas
E o próprio horizonte estava à mão
Das brincadeiras simples, divertidas.

Era o jogo do arco e do pião,
Era o brincar, também, às escondidas.
Em cada um havia um campeão
Esforçando-se, alegre, nas corridas.

No Douro, com toninhas descuidadas,
Éramos já pequenos navegantes
Embarcando no sonho dum vapor

Rumo a terras distantes, ignoradas,
Nadando nesse rio fascinante
Libertados da roupa e do pudor.

O Tempo, que não pára, foi marchando...
Os caminhos diversos que trilhámos
Lentamente nos foram afastando
Dos percursos que outrora partilhámos.

Envelhecendo, fomos caminhando
Nos projectos diversos que encetámos
E, só de longe a longe, recordando
O longínquo Passado que habitámos.

Nesse Livro da Vida que escrevemos
Não temos o direito de esquecermos
As páginas da nossa mocidade.

Porque é nelas que ainda hoje vemos
A forma solidária de vivermos
E que, afinal, nos traz tanta saudade!

(Poema e Imagem de
Fernando Peixoto)

domingo, maio 27, 2007

Ausente dos homens e das flores


Imagem de J S Rossbach


Ausente dos homens e das flores
vagueio por dentro de um túnel negro do tempo.
Não estou
Não sou
Não quero estar
Não quero ser
E conquanto, num estado de silenciado pranto,
no âmago mais profundo, esquálida
espada emerge lívida. Desejo reles e permanente,
de querer ser ... gente!
Na raiva, aglomero muros, mordo a língua, cerro os dentes,
asfixio a palavra no turbilhão ciclónico da saliva.

Ausente dos homens e das flores
Rebusco um gesto
Um sentido pressentido
Ouso elevar um braço
Iço-me etérea no oco do espaço
Dependuro-me equilibrista, acrobata,
no vértice do som mais estridente.
Nas estrelas electrizadas,
nas redondas, nas bicudas. Com a boca faço-as mudas.
Silenciadas! Abocanhadas...
Desço na cauda de um cometa a quem peço alvíssaras e meças.
Respondem-me sempre os ecos escorridos
dos fungos, dos mortíferos cogumelos, dos mais letais,
acantonados nos vitrais da memória.

Ausente dos homens e das cores
apenas o negro pinta as maças do teu rosto
e das flores e dos frutos esqueci há muito recortes, texturas, sabores!

(Poema de
Mel de Carvalho)

quinta-feira, maio 24, 2007

Ausência


Fotografia de Denis Olivier


Hoje, queria estar noutro lado,
na outra margem do sonho
sentado no muro da esperança
respirando só paixão
voltar à nascente da vida
fundir-me, de corpo e alma
fugir de mim e voar
hoje, precisamente num dia
que é mais estreito que o ar
E o estio a vir devagar
como se fosse um ladrão
deixando-me assim sem alento
Como se fosse um escombro
dobrando-me vontade a razão

(Poema de
Yardbird)

terça-feira, maio 22, 2007

beijo escrito

Pintura de Gustav Klimt



No paredão, sob o passar do vento,
olhando sem realmente ver,
ouvindo sem verdadeiramente escutar.
Ao longe, o grito das gaivotas
Ao perto, as ondas a rumorejar
num cheiro a mar que enchia os poros
e refrescava a alma.
Banhou os olhos de horizonte,
despojou-se de passado e presente...
O céu azulava-se límpido,
e o sol, ah, o sol, quente na pele
lembrava um toque leve
de dedos por chegar.
Não houve aviso, nem alarme,
apenas aquela sensação sedosa,
húmida e macia,
vibrante no poisar vagaroso,
que chegou rápido ao coração.
Da curva do pescoço,
os lábios deslizaram em ascensão,
pontilhando o canto do sorriso,
prestes a um adiado torvelhinho
em queda desejada.
Lábios que se tocam,
se tacteiam, se encontram,
num beijo-escorrega
lentamente sôfrego,
demoradamente ávido.
Que saúda a chegada.
E o dia começou.



(Poema da
Viajante in Espelhos & Labirintos)

domingo, maio 20, 2007

Fraseando ...


"Le poet" de Leon Girardet

Conheço-as
porque as profiro
conheço-as
porque a elas me refiro.

Podem ser dolorosas
quando têm a intenção de ferir
podem ser perigosas
quando têm a inclinação para denegrir.

Quem as quis
terá de saber o seu quê
quem as diz
terá de responder o porquê.

São chama
são cor
são licor
são alma.

Alma de escritor
que lhe dá o seu toque final
Alma de actor
que lhe dá o seu retoque leal.

Palavras quem as não tem
são fonte de coragem e esperança
palavras quem lhes quer bem
são ponte de margem e temperança.

Sinto-me cansado
porque escasseiam os vocábulos
sinto-me ultrapassado
porque já não sinto os cálculos.

Experiencio a sua real eficiência
enquanto reais e ardis baluartes
respeitando a sua malícia e reticência
por representarem inqualificáveis estandartes.

Estandartes que entusiasmam e alegram
porque agradavelmente as posso pronunciar
Estandartes que estimulam e sossegam
já que felizmente as posso seleccionar e divulgar.

(Poema de
António Silva)

quinta-feira, maio 17, 2007

Sinfonia das espigas

Imagem de autor desconhecido


Espigas loiras da seara sazonada
são leves nuances da natureza.
Matizes de cintura adelgaçada
inebriantes loucuras de pureza.

Alvorada de doirada aurora
são mantilhas de rendas esvoaçadas.
Madrigal à espera da hora
em ondas de cristas adejadas.


(Poema de
Pepe Luigi)

terça-feira, maio 15, 2007

Não me Morras

Este poema deixado num comentário pela Cleopatra foi inspirado na fotografia do post anterior e de autoria do Tinta Permanente ...


Fotografia de Susanne



Não me morras
sem que te ame da forma a que tens direito.
Não me morras
sem respirares os meus sussurros
sem partilhares comigo
o teu leito

Não me morras
Não te vás
sem que os meus lábios te digam do meu ser
E os meus dedos te falem do teu sentir.

Não partas
Sem viver através de mim
O que nunca te disseram
E nunca soubeste ouvir.
Há no Sol
Na névoa
Na luz da manhã
Um pôr do Sol
Que é uma promessa de amanhã

Não me morras Amor
que não mereço.

(Poema da Cleopatra)

domingo, maio 13, 2007

ao cabo do tempo



A barca já não tem porto
e os dias não consolam as noites
do pescador.
O tempo esqueceu-lhe as arribas,
as praias, os ventos
e também roubou o bailado às marés.
Dos rumos nunca achou sentido:
era preciso ir além de mais além descobrir.
Por isso cuidou que navegar
queria dizer para sempre.
...
Fez das velas o tecido dos sonhos,
mas porque viajou demais,
tornou-se estrangeiro de si mesmo.

(Poema e fotografia de Tinta Permanente- Folhas da Gaveta)

quinta-feira, maio 10, 2007

£oµ¢o Ðe £Î§ßoa

Num comentário deixado no poema anterior o £oµ¢o Ðe £Î§ßoa) mostrou toda a sua “loucura” e meteu uma cunha para aparecer no Poesia (é melhor lerem o comentário...)
Não é a primeira vez que partilho os In§†an†e§ ðe µm £oµ¢o e é com alegria que acedo ao seu pedido, porque este é um blogue de partilha a todos que amam a poesia e o valor das palavras…


Imagem do £oµ¢o Ðe £Î§ßoa


Se há diversas dimensões
Por que não vivem em mim?
Absorventes, inseparáveis
Sem nenhuma simetria.

Não há pendulos
Entre a chama que sufoca
E o oxigénio soluvel na água
Quando um se desenvolve
Através da realidade do outro.

Convivência,
Nem sequer passiva
Entre satisfação e privação
Contradições misturadas
De intuição e rectidão.
Paradigmas e sintaxes.

Tédio e tesão!

Permitam-me trespassar,
desordeiramente a fronteira.

...Das três dimensões...

(Poema do £oµ¢o Ðe £Î§ßoa)

terça-feira, maio 08, 2007

Tu mesmo...


Imagem daqui


Que um dia encontres
nas tuas mãos
aquilo que procuras
para além de ti

Que um dia descubras
no silêncio da alma
o que esperas de ti mesmo

Porque metade é querer
E outra parte é recusar

Que um dia
as metades do Amor
de que és feito
se unam e não mais se separem

Porque metade de ti é querer
E outra parte é recusar

Que um dia
alcances a plenitude
e a Paz que mereces

Porque metade de ti
é alegria
e a outra parte
é tristeza

Uma metade de ti
é a vida que te abre os braços

e a outra parte de ti...
és tu mesmo...!


(Poema da
Magia)

domingo, maio 06, 2007

A mãe

Como muitos sabem, o objectivo deste blogue, teve como propósito dar a conhecer a Poesia que ia descobrindo na blogosfera.
Depois de um intervalo e cumprindo a promessa feita, de que não iria deixar o projecto a que me dediquei de alma e coração, trago-vos um poema de alguém que já não é uma iniciante, antes pelo contrário, mas que tem um blogue lindo, muito discreto, onde vou muitas vezes, acalmar os meus dias e o meu coração…
Trata-se de
Graça Pires a quem pedi autorização para postar este poema e a imagem que recolhi do seu blogue e que aqui vos deixo com um abraço carinhoso, especialmente a todas as Mães...


Pintura de Balthus



Adivinhar, no teu rosto, o rio da infância
e deslizar, em deslumbradas canoas,
pelo sal dos teus olhos.

Afaga os meus cabelos, mãe
para que, a palavra crescer,
não doa, de novo, nos meus passos.
Deixa-me ver, na tua pele,
as linhas do silêncio,
com que teceste a coragem
e os sonhos : a parte da tua herança
que, legitimamente, me cabe.

(Poema de Graça Pires )

Adenda:
O meu agradecimento especial ao A.S. pela atribuição que fez a este blogue, do “Thinking Blogger Award”, que dedico a todos os que habitualmente me presenteiam com os seus comentários, que muito me sensibilizam. Grata a todos.

quinta-feira, maio 03, 2007

Jardim dos Poetas...

Vincent Van Gogh in Jardim dos Poetas


Tantos bons poetas! Tantos bons poemas!
São realmente bons e bons,
Com tanta concorrência não fica ninguém,
Ou ficam ao acaso, numa lotaria da posteridade,
Obtendo lugares por capricho do Empresário...
Tantos bons poetas!
Para que escrevo eu versos?
Quando os escrevo parecem-me
O que a minha emoção, com que os escrevi, me parece –
A única coisa grande no mundo...
Enche o universo de frio o pavor de mim.
Depois, escritos, visíveis, legíveis...
Ora...E nesta antologia de poetas menores?
Tantos bons poetas!
O que é o génio, afinal, ou como é que se distingue
O génio, e os bons poemas dos bons poetas?
Sei lá se realmente se distingue...
O melhor é dormir...
Fecho a antologia mais cansado do que do mundo -
Sou vulgar?...
Há tantos bons poetas!
Santo Deus!...



(Álvaro de Campos, 1/5/1928)

quinta-feira, abril 26, 2007

O improviso de viver

Óleo de Nela Vicente


Voltaremos muitas vezes a um jardim de plátanos
com o luar engatilhado nos olhos.
Dir-te-ei nomes de estrelas ao acaso,
como um desvio da fronteira desenhada ao redor de nós.
Lado a lado, iremos rever novembro pelas ruas,
devassando vigílias, cantando em surdina
a intimidade de sermos amantes,
neste percurso de pássaros subitamente em fuga.
As árvores são discretas.
Por isso, levar-te-ei para habitares comigo
o improviso de viver.
Estaremos em toda a parte.
Sobrevoaremos os espaços interditos
e seremos a notícia anunciada
pela voz indomável dos que ostentam na boca
a urgência dos beijos e do riso. Vem comigo, amor.
No escuro chegaremos à fonte pelo cheiro da sede
e moldaremos na água a transparência dos momentos
em que a madrugada se comove.

Poema de
Graça Pires